MEU JARDIM É VOCÊ
E com cuidado, pra não te acordar, eu levanto devagar, não calço os chinelos para não fazer barulho, vou descalça até a cozinha e, sem fazer o mínimo ruído, coloco a água no fogo.
Vou até o armário e pego as melhores ervas pra fazer o chá que você gosta (mesmo eu sabendo que você ama café).
Enquanto escolho as ervas, olho a janela, o barulho da chuva e o cheiro molhado me lembram você.
Devagar, volto ao quarto e te observo dormindo, estirado na cama, abraçando o travesseiro, num sono tão profundo que sinto vontade de te deixar dormindo sempre, só pra eu te sentir bem perto, na certeza de que você nunca vai se perder de mim.
O vapor da água embaça a vidraça, preparo o chá, adoço do seu gosto (com bastante açúcar).
O cheiro das ervas tomam conta do ambiente e meu coração dispara querendo logo ouvir você tomar o chá e me elogiar por sempre te tratar tão bem.
Acelero um poucos os passos pra te encontrar, olho direto na cama, mas, você já não está mais.
Penso que deve estar brincando comigo, se escondendo pra me dar um susto, mas, logo ali, perto da porta, você se olha no espelho como quem está terminando de se arrumar para sair.
Paro e fico te olhando, em meus olhos você sabe que pergunto o porquê de você não estar com o teu pijama, aquele que eu disse pra você vestir porque estava frio.
Você passou a mão no rosto, me olhou e nem notou a caneca de chá em minhas mãos.
No fundo eu sabia que você iria, mesmo assim tentei encontrar alguma ponta de esperança que dizia que você estava só me fazendo algum tipo de surpresa e que logo abriria um sorriso, pegaria a caneca de chá das minhas mãos e me agradeceria com um beijo.
Mas, não.
Você pegou as chaves, sua carteira, olhou em volta pra ver se não se esquecia de nada e, partiu.
Sem olhar pra trás, fechou a porta e a chave girou, e a porta trancou.
Fiquei ali, olhando pra porta, esperando você voltar no minuto seguinte, como eu fiz tantas vezes.
Mas não, o portão também fechou e eu pude ouvir seus passos se afastando de mim, podia até mesmo ver as suas mãos no bolso, como quem nada quer.
Sentei na beira da cama, encostei me ao travesseiro que ainda estava com teu cheiro, tomei o chá (mesmo detestando chá muito doce, mas aquilo me fazia te ter ainda perto).
E fiquei ali, acho que o dia se passou e eu nem vi.
Mas, não sofri.
Porque eu sabia que você voltaria, como vai voltar daqui uns quinze minutos.
Pedindo um abraço com o olhar ou perguntando quando é que eu posso te emprestar meu colo pra você dormir, ou o meu abraço pra você não se sentir sozinho.
Eu reguei o jardim, e você sempre volta porque as flores que eu cultivo são as que mais te atraem.
Plantei novas ervas, amanhã vou colhê las.
Quando fizer sol, vou colocá las ao sol, deixar que sequem para que o chá fique mais saboroso pra você.
E, quando voltar, não hesitarei em cuidar de você, em zelar pelo teu sono, em me dedicar novamente.
Até que você venha com as malas feitas e fique.
Só assim poderei me dedicar pra sempre ao jardim, cultivar as mais lindas flores, porque o meu jardim é você.