As Palavras São como um cristal, as palavras.Algumas, um punhal, um incêndio.Outras, orvalho apenas.Secretas vêm, cheias de memória.Inseguras navegam: barcos ou beijos, as águas estremecem.Desamparadas, inocentes, leves.Tecidas são de luz e são a noite.E mesmo pálidas verdes paraísos lembram ainda.Quem as escuta Quem as recolhe, assim, cruéis, desfeitas, nas suas conchas puras
As amorasO meu país sabe às amoras bravasno verão.Ninguém ignora que não é grande,nem inteligente, nem elegante o meu país,mas tem esta voz docede quem acorda cedo para cantar nas silvas.Raramente falei do meu país, talveznem goste dele, mas quando um amigome traz amoras bravasos seus muros parecem me brancos,reparo que também no meu país o céu é azul.
É urgente inventar a alegria,multiplicar os beijos, as searas,é rgente descobrir rosas e riose manhãs claras.
Hoje roubei todas as rosas dos jardinse cheguei ao pé de ti de mãos vazias.
Foi para ti que criei as rosas.Foi para ti que lhes dei perfume.Para ti rasguei ribeirose dei ás romãs a cor do lume.
UrgentementeÉ urgente o amor.É urgente um barco no mar.é urgente destruir certas palavras.odio, solidão e crueldade,alguns lamentosmuitas espadas.É urgente inventar alegria,multiplicar os beijos, as searas,é urgente descobrir rosas e riose manhãs clarasCai o silêncio nos ombros e a luzimpura, até doer.É urgente o amor, é urgentepermanecer.
Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,e o que nos ficou não chegapara afastar o frio de quatro paredes.Gastámos tudo menos o silêncio.Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,gastámos as mãos à força de as apertarmos,gastámos o relógio e as pedras das esquinasem esperas inúteis.Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;era como se todas as coisas fossem minhas:quanto mais te dava mais tinha para te dar.Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.E eu acreditava.Acreditava,porque ao teu ladotodas as coisas eram possíveis.Mas isso era no tempo dos segredos,era no tempo em que o teu corpo era um aquário,era no tempo em que os meus olhoseram realmente peixes verdes.Hoje são apenas os meus olhos.É pouco mas é verdade,uns olhos como todos os outros.Já gastámos as palavras.Quando agora digo: meu amor,já não se passa absolutamente nada.E no entanto, antes das palavras gastas,tenho a certezade que todas as coisas estremeciamsó de murmurar o teu nomeno silêncio do meu coração.Não temos já nada para dar.Dentro de tinão há nada que me peça água.O passado é inútil como um trapo.E já te disse: as palavras estão gastas.Adeus.