Eugénio de Andrade

A poesia é o inferno; às vezes também é o paraíso.

É possível que a poesia seja ficção, mas eu prefiro pensá la como Goethe: inseparável da verdade.

A independência tem um preço, sempre o soube, e nunca me recusei a pagá lo.

A solidão não é forçosamente negativa, pelo contrário, até me parece um privilégio.
Talvez a minha solidão seja excessiva, mas eu detestei sempre as coisas mundanas.
Estar com as pessoas apenas para gastar as horas é me insuportável.

Creio que foi o sorriso, o sorriso foi quem abriu a porta.
Era um sorriso com muita luz lá dentro, apetecia entrar nele, tirar a roupa, ficar nu dentro daquele sorriso.

O poeta é incapaz de conter um segredo, acaba sempre por dizer no poema aquilo que queria guardar só para si.

Não há arte sem tradição, mesmo a transgressão já tem a sua.

Retrato Ardente Entre os teus lábios é que a loucura acode, desce à garganta, invade a água.
No teu peito é que o pólen do fogo se junta à nascente, alastra na sombra.
Nos teus flancos é que a fonte começa a ser rio de abelhas, rumor de tigre.
Da cintura aos joelhos é que a areia queima, o sol é secreto, cego o silêncio.
Deita te comigo.
Ilumina meus vidros.
Entre lábios e lábios toda a música é minha.