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Arthur Schopenhauer

A jovialidade e a coragem da vida, características da juventude, devem se em parte ao fato de estarmos a subir a colina, sem ver a morte situada no sopé do outro lado.
Porém, ao transpormos o cume, avistamos de fato a morte, até então conhecida só de ouvir dizer.
Ora, como ao mesmo tempo a força vital começa a diminuir, a coragem também decresce, de modo que, nesse momento, uma seriedade sombria reprime a audácia juvenil e estampa se no nosso rosto.
Enquanto somos jovens, digam o que quiserem, consideramos a vida como sem fim e usamos o nosso tempo com prodigalidade.
Contudo, quanto mais velhos ficamos, mais o economizamos.
Na velhice, cada dia vivido desperta uma sensação semelhante à do delinquente ao dirigir se ao julgamento.
Do ponto de vista da juventude, a vida é um futuro infinitamente longo; do da velhice, é um passado bastante breve.
Desse modo, o começo apresenta se nos como as coisas ao serem vistas pela lente objetiva do binóculo de ópera; o fim, entretanto, como se vistas pela ocular.
É preciso ter envelhecido, portanto ter vivido muito, para reconhecer como a vida é breve.
O próprio tempo, na juventude, dá passos bem mais lentos.
Por conseguinte, o primeiro quartel da vida é não só o mais feliz, mas também o mais longo, e deixa muito mais lembranças, sendo que cada um poderia contar muito mais coisas sobre ele do que sobre o segundo quartel.
Como na primavera do ano, também na da vida os dias acabam por tornarem se incomodamente longos.
No outono de ambos, tornam se mais breves, porém mais serenos e constantes.

Nenhum caminho é mais errado para a felicidade do que a vida no grande mundo, às fartas e em festanças (high life), pois, quando tentamos transformar a nossa miserável existência numa sucessão de alegrias, gozos e prazeres, não conseguimos evitar a desilusão; muito menos o seu acompanhamento obrigatório, que são as mentiras recíprocas.
Assim como o nosso corpo está envolto em vestes, o nosso espírito está revestido de mentiras.
Os nossos dizeres, as nossas ações, todo o nosso ser é mentiroso, e só por meio desse invólucro pode se, por vezes, adivinhar a nossa verdadeira mentalidade, assim como pelas vestes se adivinha a figura do corpo.
Antes de mais nada, toda a sociedade exige necessariamente uma acomodação mútua e uma temperatura; por conseguinte, quanto mais numerosa, tanto mais enfadonha será.
Cada um só pode ser ele mesmo, inteiramente, apenas pelo tempo em que estiver sozinho.
Quem, portanto, não ama a solidão, também não ama a liberdade: apenas quando se está só é que se está livre.
A coerção é a companheira inseparável de toda a sociedade, que ainda exige sacrifícios tão mais difíceis quanto mais significativa for a própria individualidade.
Dessa forma, cada um fugirá, suportará ou amará a solidão na proporção exata do valor da sua personalidade.
Pois, na solidão, o indivíduo mesquinho sente toda a sua mesquinhez, o grande espírito, toda a sua grandeza; numa palavra: cada um sente o que é.
Ademais, quanto mais elevada for a posição de uma pessoa na escala hierárquica da natureza, tanto mais solitária será, essencial e inevitavelmente.
Assim, é um benefício para ela se à solidão física corresponder a intelectual.
Caso contrário, a vizinhança frequente de seres heterogêneos causa um efeito incômodo e até mesmo adverso sobre ela, ao roubar lhe seu ‘eu’ sem nada lhe oferecer em troca.
Além disso, enquanto a natureza estabeleceu entre os homens a mais ampla diversidade nos domínios moral e intelectual, a sociedade, não tomando conhecimento disso, iguala todos os seres ou, antes, coloca no lugar da diversidade as diferenças e degraus artificiais de classe e posição, com frequência diametralmente opostos à escala hierárquica da natureza.
Nesse arranjo, aqueles que a natureza situou em baixo encontram se em ótima situação; os poucos, entretanto, que ela colocou em cima, saem em desvantagem.
Como consequência, estes costumam esquivar se da sociedade, na qual, ao tornar se numerosa, a vulgaridade domina.