NO CÉU DO ME CONCEITO
Demétrio Sena, Magé RJ.
Quando criança, tive grande admiração pelos adultos trabalhadores que eu conheci.
Era fã do sorveteiro, por exemplo.
Aquela roupa branquinha pelo menos nas primeiras horas do dia , que lhe dava enorme respeitabilidade, não era simplesmente uniforme.
Não para mim.
Era uma espécie de farda.
Também olhava com espanto e admiração, os operários metidos em seus macacões, rumo ao trabalho nas indústrias ou na construção civil.
Nesse tempo, queria ser qualquer uma dessas figuras, quando crescesse: sorveteiro, amolador de ferramentas, operário, motorista ou "gringo".
Gringo, para mim, era vendedor de roupas e outros itens ou bugigangas, por causa do senhor português que vendia de porta em porta, e assim o chamavam, naturalmente por sua nacionalidade.
Se não desse para ser nada disso, tudo bem; eu me conformaria em ser arquiteto, médico, cientista, empresário, advogado, escritor, oficial do exército, músico e até professor.
Acabei escritor e professor, o que mais tarde escolhi, não porque passei a desprezar as preferências da infância, mas porque descobri no meu íntimo essas vocações, que também dão pouco dinheiro, no meu caso, mas me causam muito prazer, além do enorme orgulho o mesmo que teria, se fosse qualquer profissional bem resolvido, por amar a profissão e ter consciência de que o trabalho é motivo de orgulho.
Nestes tempos em que a mídia só louva os ricos, famosos, poderosos e influentes, apontando os como os únicos bem sucedidos, por causa dos grandes resultados materiais que ostentam, às vezes creio que permaneci criança.
O mesmo menino que ambicionava profissões bem simples e rudimentares, reconhecendo nelas uma dignidade que hoje não vejo reconhecida nos olhos de quase ninguém.
Às vezes, nem mesmo nos de quem as exerce, por ser influenciado negativamente pela visão corporativa dos meios de comunicação.
Tenho, evidentemente, meus ícones culturais e artísticos.
Amo a literatura e sou fã de alguns escritores.
Aprecio artes plásticas, música, filmes, novelas, outras manifestações culturais, e isso me faz admirar quem as pratica.
Também admiro cientistas, desportistas, arquitetos, advogados, empresários, médicos, conferencistas, porém não mais nem menos do que aqueles trabalhadores que sempre foram meus ídolos.
Continuo tendo grande admiração pelo sorveteiro, o operário, o amolador de ferramentas, o motorista, o "gringo" e todos os outros cidadãos que, só por serem trabalhadores, honestos, e saberem viver dignamente com o que ganham, são bem sucedidos e por essa virtude, são estrelas no céu do meu conceito.