Lembro me como se fosse ontem de quando meu irmão retirou os quatro sisos e corria atrás de mim para me assustar, com a boca toda vermelha de sangue.
Na época isso estava fora do protocolo cirúrgico.
Ele era fora do comum!
Meu heroi que virou meu anjo pouco tempo depois.
Eu tinha oito anos quando entrava em seu quarto para tentar sentir sua presença.
Abria os armários porque queria sentir seu cheiro, que até hoje está guardado na memória.
Uma sinestesia deliciosa! Queria um pouco dele para mim.
Abraçava as roupas; mexia nas canetas coloridas e diferentes; visualizava as assinaturas dele, algumas customizações; observava atentamente seus adornos e brincava com o globo terrestre.
Então, abria seu criado mudo.
No silêncio das minhas ideias turbulentas, pegava as coisinhas dele que ficavam do jeitinho que ele havia deixado e abstraia.
Em uma caixinha ficavam tais sisos! Olhava admirada pelo tamanho dos dentes e como eram bonitos! Sempre indagava: cientistas poderiam fazer um clone do Dri usando o DNA contido nessas preciosas peças brancas.
Mas logo depois, raciocinava que seria preciso copiar a alma dele também.
O que adianta ter meu irmão de volta fisicamente e sua alma não for a mesma
Com todo meu jeito de criança, após as fantasias, fechava a caixinha, depois a gaveta e abria minha mente para meu mundo e para o mundo que descobria a cada momento.