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Textos de Menina Mulher

Construção
Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego
Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho seu como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público
Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contramão atrapalhando o sábado

Terapia do amor
O filme Terapia do Amor conta a história de uma mulher de 37 anos que se envolve com um garotão de 23, e a coisa funciona às maravilhas, é claro, porque um homem e uma mulher a fim um do outro é sempre uma combinação explosiva, não importa a idade.
Mas como em todo conto de fadas que se preze, há a bruxa, no caso a mãe do guri, que não gosta nadinha da idéia, mesmo sendo uma psicanalista de cabeça feita aliás, psicanalista da própria nora, descobre ela tarde demais.
Deste "triângulo" surgem as tiradas engraçadas (Meryl Streep dando show, como sempre) e também a partezinha do filme que faz pensar.
Pensei.
Mas não na questão da diferença de idade, tão comum nas relações atuais.
Se antes era natural homens mais velhos se relacionarem com ninfetas, agora as mulheres mais maduras (não existe mulher velha antes dos cem) se relacionam com caras mais jovens e está tudo certo, até porque eles também tiram proveito.
A troco de quê gastar energia com uma garotinha cheia de inseguranças Mais vale uma quarentona que perdeu a chatice natural de toda mulher e se tornou serena, independente, auto confiante e bem humorada.
São mais relaxadas, garantem o próprio sustento e não perdem tempo fazendo drama à toa.
Qual o homem que não vai querer uma mulher assim Se você acha que este parágrafo foi uma defesa em causa própria e a de todo o mulherio que não tem mais 20 anos, acertou, parabéns, pegue seu prêmio na saída.
Sem brincadeira: o mais interessante do filme, a meu ver, foi mostrar que é difícil viver um relacionamento sabendo que ele vai terminar ali adiante, mas nunca será tempo perdido.
Fomos todos criados para o "pra sempre", como se o objetivo de todos os casais ainda fosse o de constituir família.
Quando é, convém pensar a longo prazo.
Só que hoje muitas pessoas se relacionam sem nenhum outro objetivo que não seja o de estar feliz naquele exato momento, mesmo sabendo que as diferenças de religião, idade, condição social ou ideologia poderão encurtar a história (poderão, não quer dizer que irão).
Há cada vez menos iludidos.
Poucos são aqueles que atravessam uma vida tendo um único amor, então, vale o que está sendo vivido, o momento presente.
"Dar certo" não está mais relacionado ao ponto de chegada, mas ao durante.
A personagem de Meryl Streep, depois de ter todos os chiliques normais de uma mãe que acha que o filhote está perdendo em vez de estar ganhando com a experiência, organiza melhor seus pensamentos e diz, ao final do filme, uma coisa que pode parecer fria para ouvidos mais sensíveis, mas é um convite a cair na real: "Podemos amar, aprender muito com este amor e partir pra outra".
O compromisso com a eternidade é opcional e ninguém merece ser chamado de frívolo por não fazer planos de aposentar se juntos.
Já escrevi sobre isso em outras ocasiões e sempre acham que estou descrevendo o apocalipse.
Ao contrário, triste é passar a vida falando mal do casamento estando casado e colecionando casos extraconjugais e mentiras dolorosas.
Melhor legitimar os amores mais leves, menos fóbicos, comprometidos com os sentimentos e não com as convenções.
Estes serão os melhores amores, que poderão, quem sabe, até durar para sempre, o que será uma agradável surpresa, jamais uma condenação.

Pra começo de conversa, não acredito que haja uma única mulher no mundo que seja santa.
Os marmanjos devem estar de cabelo em pé: como assim, e a minha mãe
Nem ela, caríssimos, nem ela.
Existe mulher cansada, que é outra coisa.
Ela deu tanto azar em suas relações, que desanimou.
Ela ficou tão sem dinheiro de uns tempos pra cá, que deixou de ter vaidade.
Ela perdeu tanto a fé em dias melhores, que passou a se contentar com dias medíocres.
Guardou sua loucura em alguma gaveta e nem lembra mais.
Santa mesmo, só Nossa Senhora, mas, cá entre nós, não é uma doideira o modo como ela engravidou (Não se escandalize, não me mande e mails, estou brin can do.)
Toda mulher é doida.
Impossível não ser.
A gente nasce com um dispositivo interno que nos informa desde cedo que, sem amor, a vida não vale a pena ser vivida, e dá lhe usar o nosso poder de sedução para encontrar "the big one", aquele que será inteligente, másculo, se importará com nossos sentimentos e não nos deixará na mão jamais.
Uma tarefa que dá para ocupar uma vida, não é mesmo Mas além disso, temos que ser independentes, bonitas, ter filhos e fingir, às vezes, que somos santas, ajuizadas, responsáveis, e que nunca, mas nunca, pensaremos em jogar tudo para o alto e embarcar num navio pirata comandado pelo Johnny Depp, ou então virar loura e cafetina, sei lá, diga aí uma fantasia secreta, sua imaginação deve ser melhor que a minha.
Eu só conheço mulher louca.
Pense em qualquer uma que você conhece e me diga se ela não tem ao menos três dessas qualificações: exagerada, dramática, verborrágica, maníaca, fantasiosa, apaixonada, delirante.
Pois então.
Também é louca.
E fascinante.
Todas as mulheres estão dispostas a abrir a janela, não importa a idade que tenham.
Nossa insanidade tem nome: chama se Vontade de Viver até a Última Gota.
Só as cansadas é que se recusam a levantar da cadeira para ver quem está chamando lá fora.
E santa, fica combinado, não existe.
Uma mulher que só reze, que tenha desistido dos prazeres da inquietude, que não deseje mais nada Você vai concordar comigo: só sendo louca de pedra.

Luz, câmera, ação: e então filma se o silêncio entre um homem e uma mulher que não se vêem há nove anos, e então filmam se todas as dúvidas sobre se devem se tocar ou não, se beijar ou não.
Então filma se o papo inicial, cauteloso, até que chega a hora da explosão, dos desabafos, das acusações e do quase choro.
Então filma se o que poderia ter sido especulações e o que será daqui por diante especulações também.
E se o que faz o amor sobreviver for justamente a falta de convivência e rotina Quem apostaria num amor apenas idealizado E se a nossa intuição for mesmo a melhor conselheira e não merece ser desprezada E se nossas lembranças nos traírem E se casamento nenhum for mais importante do que um único encontro
O cinema pode colocar pessoas desafiando a gravidade, cortando o pescoço uns dos outros, fazendo o tempo andar pra trás, e eu não me emocionarei nem ficarei perplexa, mas me dê um pouco de realidade e isso me arrebata.
Luz, câmara e outro tipo de ação
Existem filmes de ação com tiroteios, velocidade, cenas multipicotadas, sustos, finais bombásticos, superproduções.
De vez em quando, até gosto.
Mas os filmes de ação que estão entre meus preferidos são aqueles que, aparentemente, não têm ação nenhuma.
Um bom exemplo é Antes do Pôr do Sol, que dá continuidade ao Antes do Amanhecer e que finalmente entrou em cartaz.
O filme é um blablablá ininterrupto entre um casal que caminha por Paris e discute a vida e a relação.
Filme cabeça ou filme chato, rotule você.
Mas não diga que não é um filme de ação.
Medo, suspense, aflição, expectativa: diálogos também provocam tudo isso.
Como não sentir se especialmente tocado por uma jovem mulher que admite ter perdido a ilusão do amor e que passou a viver blindada, refratária a qualquer nova relação Como não sentir se mexido quando um homem admite que casou porque todos casam, que passa 24 horas por dia infeliz e que a única coisa que lhe justifica a vida é o filho de quatro anos O que pode ser mais mirabolante, impactante, desestabilizante, emocionante do que ver duas frágeis criaturas, um homem e uma mulher predestinados um ao outro, enfrentando a crueza da distância física e do tempo, e a irrealização de seus sonhos Não se costuma catalogar estas pequenas crises existenciais como filmes de ação, mas elas me prendem na cadeira como nem uma dezena de Matrix conseguiria.

Pedaços de mulher
( ) Quantos pedaços formam uma mulher Tantos que ela vive inacabada.
Nossos pedaços custam a se encaixar.
O epicentro do quebra cabeça costuma ser a maternidade, um pedaço grande que precisa combinar com o pedaço da luxúria, com o pedaço da solidão e também com aquela partezinha da preguiça, que ninguém avisou que fazia parte do jogo.
Há peças variadas, que vistas separadamente, não têm nada a ver uma com a outra, mas juntas fazem o shazam.
O pedaço da submissão que precisava encaixar com o pedaço da rebeldia, o pedaço da juventude que tem que encaixar com o pedaço da menopausa, um pedaço desgarrado que tem que encaixar com o imenso pedaço da nossa árvore genealógica, e vários outros pedaços aparentemente sem combinação: nossa parte homem, nossa parte criança, nossa parte louca, nossa parte santa, nossa parte lúcida, nossa parte conveniente, nossa parte viciada, e mais aquelas desgastadas pelo uso, e umas que se perderam, e outras tão pequenas que ficaram invisíveis.
Como encaixar o que não se revela nem para nós mesmas
Almadôvar filma as mulheres como se elas fossem pizzas de vários sabores.
Mezzo freiras, mezzo HIV positivas.
Mezzo doces, mezzo apimentadas.
Mezzo dramáticas, mezzo divertidas.
Almadôvar nunca fecha o quebra cabeça, apenas esparrama na tela os vários pedaços que, unidos, nos transformariam num ser único, e que, uma vez pronto, já não empolgariam ninguém.Daí a importância se haver sempre uma peça faltando, pois é isso que nos mantém acordados, assim no cinema como na vida.