A Casa Branca Nau Preta
Estou reclinado na poltrona, é tarde, o Verão apagou se
Nem sonho, nem cismo, um torpor alastra em meu cérebro
Não existe manhã para o meu torpor nesta hora
Ontem foi um mau sonho que alguém teve por mim
Há uma interrupção lateral na minha consciência
Continuam encostadas as portas da janela desta tarde
Apesar de as janelas estarem abertas de par em par
Sigo sem atenção as minhas sensações sem nexo,
E a personalidade que tenho está entre o corpo e a alma
Quem dera que houvesse
Um terceiro estado pra alma, se ela tiver só dois
Um quarto estado pra alma, se são três os que ela tem
A impossibilidade de tudo quanto eu nem chego a sonhar
Dói me por detrás das costas da minha consciência de sentir
As naus seguiram,
Seguiram viagem não sei em que dia escondido,
E a rota que devem seguir estava escrita nos ritmos,
Os ritmos perdidos das canções mortas do marinheiro de sonho
Árvores paradas da quinta, vistas através da janela,
Árvores estranhas a mim a um ponto inconcebível à consciência de as estar vendo,
Árvores iguais todas a não serem mais que eu vê las,
Não poder eu fazer qualquer coisa gênero haver árvores que deixasse de doer,
Não poder eu coexistir para o lado de lá com estar vos vendo do lado de cá.
E poder levantar me desta poltrona deixando os sonhos no chão
Que sonhos Eu não sei se sonhei Que naus partiram, para onde
Tive essa impressão sem nexo porque no quadro fronteira
Naus partem naus não, barcos, mas as naus estão em mim,
E é sempre melhor o impreciso que embala do que o certo que basta,
Porque o que basta acaba onde basta, e onde acaba não basta,
E nada que se pareça com isto devia ser o sentido da vida
Quem pôs as formas das árvores dentro da existência das árvores
Quem deu frondoso a arvoredos, e me deixou por verdecer
Onde tenho o meu pensamento que me dói estar sem ele,
Sentir sem auxílio de poder para quando quiser, e o mar alto
E a última viagem, sempre para lá, das naus a subir
Não há, substância de pensamento na matéria de alma com que penso
Há só janelas abertas de par em par encostadas por causa do calor que já não faz,
E o quintal cheio de luz sem luz agora ainda agora, e eu.
Na vidraça aberta, fronteira ao ângulo com que o meu olhar a colhe
A casa branca distante onde mora Fecho o olhar
E os meus olhos fitos na casa branca sem a ver
São outros olhos vendo sem estar fitos nela a nau que se afasta.
E eu, parado, mole, adormecido,
Tenho o mar embalando me e sofro
Aos próprios palácios distantes a nau que penso não leva.
As escadas dando sobre o mar inatingível ela não alberga.
Aos jardins maravilhosos nas ilhas inexplícitas não deixa.
Tudo perde o sentido com que o abrigo em meu pórtico
E o mar entra por os meus olhos o pórtico cessando.
Caia a noite, não caia a noite, que importa a candeia
Por acender nas casas que não vejo na encosta e eu lá
Úmida sombra nos sons do tanque noturna sem lua, as rãs rangem,
Coaxar tarde no vale, porque tudo é vale onde o som dói.
Milagre do aparecimento da Senhora das Angústias aos loucos,
Maravilha do enegrecimento do punhal tirado para os atos,
Os olhos fechados, a cabeça pendida contra a coluna certa,
E o mundo para além dos vitrais paisagem sem ruínas
A casa branca nau preta
Felicidade na Austrália