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Rituais de Trance

Meus grandes momentos de felicidade não coincidem com grandes
momentos.
Não se tratam de rituais de passagem, de grandes realizações, não têm holofotes, arranjos de flores, entradas triunfais, rufar de tambores.
Poucos deles ficaram na memória associados a uma data e são muito mais sensações, frases soltas, pequenos gestos do que propriamente grandes momentos.
Foram, na verdade, ordinariedades simples capazes de parar o tempo e me mostrar a perfeição do instante, de revelar milagrosamente, como quem tira um coelho da cartola, a felicidade irretocável que eu estava vivendo.
Gérberas enroladas em papel pardo numa manhã de sábado.
Café com empada e jornal na Rua da República.
Banheira e sopa de abóbora temperada de lexotan.
Saguão de aeroporto esperando amigos que conversavam fumando.
A mão que brinca por debaixo das cobertas com a minha tornozeleira.
Cadeiras lado a lado no salão de beleza com a irmã que vai casar.
A subida da serra num carro 1.0 com Facelo de co piloto e DJ.
Amigos dividindo pão de queijo e café pra se despedir.
Um quarto de hotel num fim de tarde fúcsia com os Morelembaum de trilha.
A boca cheia de spaguetti.
Calor, refrigerante, poeira e 8.000km num carro sem ar condicionado.
Nininha fritando bolo de batata.
Ser embalada aos pulinhos.
Um anel escondido nos lençóis.
"Ticcia, Ticcia, ó, não tê lua, tê estelinhas".
O Frescão na chegada ao Rio.
Roupa manchada de laranja 60 percebes depois.
Chope do Liliput.
O elogio de um cara genial.
A escada rolante do desembarque.
Sentir me em casa.