Uma morte são várias.
Vários vazios vestidos de solidão.
Há deles de preto, de branco.
Há rostos vermelhos de choro implorando atenção.
Mas é pedido calado, cansado: não há forças para gritar ou falar ou desejar.
Contente se em se sentir culpado: acabou o tempo de dizer perdão.
Uma morte são amores antes contidos e agora em erupção.
Ela morreu, ele morreu, e meus pêsames, meus sentimentos, meus ressentimentos não vão causar nada nesse luto.
Há todos os amores do mundo e todas as maiores purezas, agora durezas, ali, sozinhas, como se Deus não fosse justo.
Deus Ah, Deus é questionado, é tachado de negro e tão imperfeito quanto quem matou meu irmão.
Deus Ah, Deus é citado, é pedido, é implorado, é chorado, é amado, é quem, apenas, é capaz de acalmar aquela alma que ali para e aqueles corações que ali se desmancham.
Uma morte são várias.
É daquele violão, quem vai tocá lo
É daquele amor, quem vai amá lo
É daquele arroz insosso, daquele arroz salgado, daquele feijão aguado, daquele "eu não sei cozinhar".
É daquele vestido azul, daquele chapéu marrom, daquela meia rasgada e do acordar às seis para não enfrentar a fila do pão.
É dele(a) sempre quase começando a academia na segunda feira.
É dos olhos e do sorriso que você decorou.
É da gargalhada que de tão alta te fez perder as contas de quantos "shiu" já soprou.
É das contas que deixaram penduradas, é das madrugadas bem dormidas e mal comidas, é das dores de amor e de barriga.
De rir e de chorar e de ter comido demais porque a promoção era boa.
A morte é do telefone, do endereço, da identidade, da altura e das piadas sobre a mesma.
É a falta de oxigênio e de luz, é o negro que se instala no espaço do seu cérebro que aquela pessoa conquistou e que você insiste em chamar de coração.
Não é questão de cor.
Não é tudo preto ou branco ou transparente (vazio).
Uma morte é a saudade de todos os "é" de alguém.
É a falta de SER.