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Paciência

Para atravessar agosto é preciso antes de mais nada paciência e fé.
Paciência para cruzar os dias sem se deixar esmagar por eles, mesmo que nada aconteça de mau; fé para estar seguro, o tempo todo, que chegará setembro e também certa não fé, para não ligar a mínima às negras lendas deste mês de cachorro louco.
É preciso quem sabe ficar se distraído, inconsciente de que é agosto, e só lembrar disso no momento de, por exemplo, assinar um cheque e precisar da data.
Então dizer mentalmente ah! , escrever tanto de tanto de mil novecentos e tanto e ir em frente.
Este é um ponto importante: ir, sobretudo, em frente.
Para atravessar agosto também é necessário reaprender a dormir, dormir muito, com gosto, sem comprimidos, de preferência também sem sonhos.
São incontroláveis os sonhos de agosto: se bons, deixam a vontade impossível de morar neles, se maus, fica a suspeita de sinistros angúrios, premonições.
Armazenar víveres, como às vésperas de um furacão anunciado, mas víveres espirituais, intelectuais, e sem muito critério de qualidade.
Muitos vídeos de chanchadas da Atlântida a Bergman; muitos CDs, de Mozart a Sula Miranda; muitos livros, de Nietzche a Sidney Sheldon.
Controle remoto na mão e dezenas de canais a cabo ajudam bem: qualquer problema, real ou não, dê um zap na telinha e filosoficamente considere, vagamente onipotente, que isso também passará.
Zaps mentais, emocionais, psicológicos, não só eletrônicos, são fundamentais para atravessar agostos.
Claro que falo em agostos burgueses, de médio ou alto poder aquisitivo.
Não me critiquem por isso, angústias agostianas são mesmo coisa de gente assim, meio fresca que nem nós.
Para quem toma trem de subúrbio às cinco da manhã todo dia, pouca diferença faz abril, dezembro ou, justamente, agosto.
Angústia agostiana é coisa cultural, sim.
E econômica.
Mas pobres ou ricos, há conselhos – ou precauções úteis a todos.
O mais difícil: evitar a cara de Fernando Henrique Cardoso em foto ou vídeo, sobretudo se estiver se pavoneando com um daqueles chapéus de desfile a fantasia categoria originalidade Esquecê lo tão completamente quanto possível (santo ZAP! ): FHC agrava agosto, e isso é tão grave que vou mudar de assunto já.
Para atravessar agosto ter um amor seria importante, mas se você não conseguiu, se a vida não deu, ou ele partiu sem o menor pudor, invente um.
Pode ser Natália Lage, Antônio Banderas, Sharon Stone, Robocop, o carteiro, a caixa do banco, o seu dentista.
Remoto ou acessível, que você possa pensar nesse amor nas noites de agosto, viajar por ilhas do Pacífico Sul, Grécia, Cancún ou Miami, ao gosto do freguês.
Que se possa sonhar, isso é que conta, com mãos dadas, suspiros, juras, projetos, abraços no convés à lua cheia, brilhos na costa ao longe.
E beijos, muitos.
Bem molhados.
Não lembrar dos que se foram, não desejar o que não se tem e talvez nem se terá, não discutir, nem vingar se, e temperar tudo isso com chás, de preferência ingleses, cristais de gengibre, gotas de codeína, se a barra pesar, vinhos, conhaques tudo isso ajuda a atravessar agosto.
Controlar o excesso de informações para que as desgraças sociais ou pessoais não dêem a impressão de serem maiores do que são.
Esquecer o Zaire, a ex Iugoslávia, passar por cima das páginas policiais.
Aprender decoração, jardinagem, ikebana, a arte das bandejas de asas de borboletas coisas assim são eficientíssimas, pouco me importa ser acusado de alienação.
É isso mesmo, evasão, escapismos, explícitos.
Mas para atravessar agosto, pensei agora, é preciso principalmente não se deter de mais no tema.
Mudar de assunto, digitar rápido o ponto final, sinto muito perdoe o mau jeito, assim, veja, bruto e seco.

Atalhos
Quanto tempo a gente perde na vida Se somarmos todos os minutos jogados fora, perdemos anos inteiros.
Depois de nascer, a gente demora pra falar, demora pra caminhar, aí mais tarde demora pra entender certas coisas, demora pra dar o braço a torcer.
Viramos adolescentes teimosos e dramáticos.
Levamos um século para aceitar o fim de uma relação, e outro século para abrir a guarda para um novo amor, e já adultos demoramos para dizer a alguém o que sentimos, demoramos para perdoar um amigo, demoramos para tomar uma decisão.
Até que um dia a gente faz aniversário.
37 anos.
Ou 41.
Talvez 48.
Uma idade qualquer que esteja no meio do trajeto.
E a gente descobre que o tempo não pode continuar sendo desperdiçado.
Fazendo uma analogia com o futebol, é como se a gente estivesse com o jogo empatado no segundo tempo e ainda se desse ao luxo de atrasar a bola pro goleiro ou fazer tabelas desnecessárias.
Que esbanjamento.
Não falta muito pro jogo acabar.
É preciso encontrar logo o caminho do gol.
Sem muita frescura, sem muito desgaste, sem muito discurso.
Tudo o que a gente quer, depois de uma certa idade, é ir direto ao assunto.
Excetuando se no sexo, onde a rapidez não é louvada, pra todo o resto é melhor atalhar.
E isso a gente só alcança com alguma vivência e maturidade.
Pessoas experientes já não cozinham em fogo brando, não esperam sentados, não ficam dando voltas e voltas, não necessitam percorrer todos os estágios.
Queimam etapas.
Não desperdiçam mais nada.
Uma pessoa é sempre bruta com você Não é obrigatório conviver com ela.
O cara está enrolando muito Beije o primeiro.
A resposta do emprego ainda não veio Procure outro enquanto espera.
Paciência só para o que importa de verdade.
Paciência para ver a tarde cair.
Paciência para sorver um cálice de vinho.
Paciência para a música e para os livros.
Paciência para escutar um amigo.
Paciência para aquilo que vale nossa dedicação.
Pra enrolação, atalho.