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Bateu Saudade

Me bateu uma saudade agora, saudade do tempo que eu era criança; que tomava tic tac dizendo que era remédio; do tempo que eu brincava na rua sem me preocupar com nada; do tempo que eu ia pro sítio do meu avô e me enfiava mato a dentro; do tempo que eu brigava com minha mãe só para lavar o cabelo; do tempo que eu não via maldade em nada; que eu dormia no colo da minha avó, porque ali era onde eu me sentia plenamente segura; saudade de quando dava altas risadas com minha prima; saudades de dançar como se aquela fosse a ultima vez que eu ia fazer aquilo; saudade de passar três anos planejando minha festa de 15 anos para que fosse perfeita, e realmente foi, do jeito que eu queria; saudades de amar e ser amada; saudades de ir ao shopping só pra comprar pretzoo; saudades da minha antiga turma da escola; saudades de sentir um abraço apertado e inesperado em mim; saudades daquela menina que se preocupava com o que os outros pensariam dela; daquela menina ingenua que acreditava em "Eu te amo" falsos; da menina que amava fazer duas trancinhas ou dois rabos de cavalo no alto da cabeça; que se sentia segura em baixo do lençol; que tinha medo de dormir sozinha no escuro; que tinha que ver os outros bem para estar bem; que segurava o choro quando alguém dizia algo ruim pra ela; que nunca dizia não; que se apaixonava fácil; que era até mesmo um pouco fútil.
Hoje em dia essa menina cresceu, não tem mais o colo da avó, não toma mais tic tac como remédio, não brinca mais na rua, não se enfia mais mato a dentro no sítio do avô, que hoje vê maldade não sempre, mais vê, hoje essa menina é forte, deixou de ser criança, deixou de acreditar em monstros como também deixou de acreditar em contos de fadas, ela está sempre dando mais um paço para a independência, a menina que já sente o peso da maior idade, que ta vendo a responsabilidade avançando e ela ta chegando rápido, que precisa ser forte, mais que ainda tem seus medos, suas inseguranças, que as vezes chora por sentir saudade de quando era apenas uma criança ingenua,e que sabe que tem que conquistar seu lugar no mundo, mais que é guerreira, que luta pra conseguir aquilo que acredita ser bom pra ela e que vai lutar até o fim, mais sem passar por cima de ninguém, para que poça dizer "Eu lutei e eu consegui" e depois que disser isso se orgulhar da mulher que se tornou!

Ás vezes a saudade bate com tanta força que diante da veemência dos estragos deixados durante a sua passagem, dificilmente alguém se atreve a definir com propriedade quem – até o presente momento foi a sua maior vitima; se o olhar, que na incerteza de um reencontro se vê incapaz de esconder as marcas do seu descontentamento mais sincero, ou se a pele, que de tão acostumada com as tantas e tão intensas entregas sempre bordadas com fios de cumplicidade, já não sabe expressar com clareza se o que mais sente é a falta ou uma falta de sentir.
Abraços costumam ser genuinamente aceitos e compreendidos, não importa o idioma de quem materialize um sentimento.
Mas quando se tem pele com alguém, estando aninhado(a) no (a)braço do outro como se logo adiante a eternidade estivesse à nossa espera, percebemos, sem equívocos, que aquele lugar foi especialmente criado para acalmar nossas dúvidas mais traidoras, bem como para acomodar nossas certezas mais doces.
Que ali, dentro daquele gesto, só há espaço para a conjugação do verbo ser.
E então somos.
Nós.
Sós.
E naquele breve instante onde os nossos olhares se encontram preenchendo o espaço deixado pela (agora, dispensável) fala que se perdeu pelo caminho, nada mais importa tanto quanto estarmos ali, em silêncio.
Ambos em unidade.
Dois corações numa única batida.
Ritmada.
Intensa.
Criteriosa.
Tendo o silêncio como nosso aliado, permitindo que a nossa respiração agora se vista de trilha sonora.
A nossa.
E nela pegamos carona com destino à certeza mais aconchegante.
Embalados pelo cheiro mais apaziguador.
Guiados pelos toques mais verdadeiros.
Como é bom estarmos juntos para sermos, pura e simplesmente, nós.