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Amor Marta Medeiros

O Medo do Amor
Medo de amar Parece absurdo, com tantos outros medos que temos que enfrentar: medo da violência, medo da inadimplência, e a não menos temida solidão, que é o que nos faz buscar relacionamentos.
Mas absurdo ou não, o medo de amar se instala entre as nossas vértebras e a gente sabe por quê.
O amor, tão nobre, tão denso, tão intenso, acaba.
Rasga a gente por dentro, faz um corte profundo que vai do peito até a virilha, o amor se encerra bruscamente porque de repente uma terceira pessoa surgiu ou simplesmente porque não há mais interesse ou atração, sei lá, vá saber o que interrompe um sentimento, é mistério indecifrável.
Mas o amor termina, mal agradecido, termina, e termina só de um lado, nunca se encerra em dois corações ao mesmo tempo, desacelera um antes do outro, e vai um pouco de dor pra cada canto.
Dói em quem tomou a iniciativa de romper, porque romper não é fácil, quebrar rotinas é sempre traumático.
Além do amor existe a amizade que permanece e a presença com que se acostuma, romper um amor não é bobagem, é fato de grande responsabilidade, é uma ferida que se abre no corpo do outro, no afeto do outro, e em si próprio, ainda que com menos gravidade.
E ter o amor rejeitado, nem se fala, é fratura exposta, definhamos em público, encolhemos a alma, quase desejamos uma violência qualquer vinda da rua para esquecermos dessa violência vinda do tempo gasto e vivido, esse assalto em que nos roubaram tudo, o amor e o que vem com ele, confiança e estabilidade.
Sem o amor, nada resta, a crença se desfaz, o romantismo perde o sentido, músicas idiotas nos fazem chorar dentro do carro.
Passa a dor do amor, vem a trégua, o coração limpo de novo, os olhos novamente secos, a boca vazia.
Nada de bom está acontecendo, mas também nada de ruim.
Um novo amor Nem pensar.
Medo, respondemos.
Que corajosos somos nós, que apesar de um medo tão justificado, amamos outra vez e todas as vezes que o amor nos chama, fingindo um pouco de resistência mas sabendo que para sempre é impossível recusá lo.

Test drive para o amor
Existem muitas maneiras de duas pessoas apaixonadas se conhecerem melhor: irem juntas ao cinema, sairem para um chope, passearem de bicicleta, fazerem festa com os amigos, motel.
É a programação clichê da maioria dos namorados.
Mas será que isso basta para conhecer alguém Um homem e uma mulher podem tomar quatrocentos litros de chope juntos e continuarem sabendo muito pouco um do outro.
Uma coisa é saber o que ele pensa, e isso pode ser feito numa mesa de bar.
Outra é saber como ele é, e isso requer mais intimidade, e não é de sexo que se está falando.
É de convivência 24 horas.
Como descobrir, antes de casar ou morar junto, se ele ronca, se ela demora no banho, se ele usa fio dental, se ela acorda de mau humor, se ele sabe lidar com o inesperado, se ela é mesmo independente Pegando a estrada.
Viajar juntos é o grande teste para um casal.
Passar alguns dias acampando, ou num hotel, numa casa alugada, não importa onde, desde que seja um território neutro onde se possa repartir os bons e maus momentos, descobrir as manias de cada um, os hábitos que foram herdados dos pais, a verdadeira face oculta, que dificilmente se revela numa festa de sábado.
Ela sempre aparecia cheirosa nos encontros.
Perfumaria.
Viajando juntos, você descobre que ela é adepta do banho de gato, uns respingos e deu.
Dorme com uma baba no cabelo, que é pra não ressecar.
Usa a mesma camiseta cinco dias seguidos e sua escova de dentes completou três aninhos em agosto.
Ele sempre falou que honestidade era sua maior virtude.
Nota se.
Na estrada, tentou subornar dois guardas.
Chegando na casa que alugaram, ele deu um jeito de emperrar uma janela para pedir um abatimento no preço.
Ao fazerem as primeiras compras no mercadinho da cidade, você o flagrou escondendo uma barra de chocolate no casaco e passando pelo caixa sem pagar.
Um exemplo de dignidade.
É claro que, na maioria das vezes, uma viagem confirma que a pessoa que elegemos é mesmo maravilhosa, e novas qualidades são descobertas.
Mas é conveniente não reservar as surpresas para a lua de mel.
Pequenas viagens de fins de semana, ao longo do relacionamento, podem ser muito reveladoras.
Você já sabe que ele gosta de filmes de ação e que ela prefere comer peixe, mas os dois só saberão dos detalhes da personalidade de cada um se criarem uma pequena rotina doméstica, fora da vida social.
Isso é brincar de casinha Que seja.
Ainda é o melhor teste para saber se o amor resistirá a uma vida de verdade.