Frases.Tube

Ricardo Ferrara

Diálogos da vida e da morte
Ultimamente, tenho pensado sobre o sentido da vida e no sentido da morte.
Dormimos e acordamos.
A dinâmica da respiração.
As contrações do coração e dos pulmões.
Processos nos quais estamos diante o tempo todo e quase não damos importância.
No plano vivencial, vida e morte não são condições irreconciliáveis, dado que aceitando ou não, convivemos com essas duas realidades.
O filósofo estóico Sêneca nos instrui a cada dia sermos organizados como se fosse o último e concluísse a nossa vida.
Chama nos a atenção de que a qualidade de vida é mais decisiva para a nossa felicidade, que não é isenta de conflitos e tristezas, do que a vida na perspectiva cronológica do passar dos anos.
Olhar o mundo como se fosse despedida, para fazermos coisas melhores do que já fazíamos e sermos mais do que estávamos acostumados a ser, no sentido de plenitude da existência.
São tantas as pessoas que encontrei e que já partiram.
O tempo em que vivi com elas jamais será destruído.
Trago um Kairós dentro de mim, um santuário feito de memória e recordações.
Todavia, estou no Khrónos, no eterno devir, nas infinitas possibilidades para vida, que ao mesmo tempo afeta meu plano vivencial.
Como Francisco de Assis, chamo a morte de irmã e vivo no ventre da mãe vida.
O Mestre de Nazaré, aquele que tem a eternidade no olhar e no coração ensinou que "se o grão de trigo caindo na terra não morrer, fica ele só; mas se morrer, dá muito fruto." A condenação de não morrer é o cárcere da solidão eterna, dado o fechamento para as possibilidades da vida.
A semente que não vingou, não pôde ir além de si mesma para dar frutos.
Certamente, não é nem um pouco agradável ter uma experiência de morte, e que o diga a semente.
Quando ela morre, abandona aquela forma de semente, fixa raízes na terra, cresce em direção ao alto e transborda em frutos.
Torna se uma árvore frondosa.
Seus frutos trazem em si sementes da vida e deram mais vida a alguém, mesmo passando pela experiência da morte, da transformação.
A mesma comparação aplica se às alegrias e tristezas da vida.
Sofremos com algumas tristezas, para que nossas alegrias sejam inteiras e múltiplas.
Isso me faz lembrar muito de Ricardo Reis, um dos personagens de Fernando Pessoa: "Para ser grande, sê inteiro: nada teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa, põe quanto és no mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda brilha, porque alta vive." Tiro a lição que humanizar se é um trabalho para a vida toda, que não pode prescindir dessas experiências de morte.
Uma ostra deve ser ferida para produzir pérolas.
A humanidade passa por essas experiências para descobrir a possibilidade de ir além de si mesma, para que possa ir fundo à razão de sua existência e se espantar que a vida vive e a morte morre, afinal, o espanto, a admiração, o silêncio frutuoso que precede à palavra falada, escrita e cantada é o alicerce da verdadeira filosofia, que é humilde, não se arroga sábia, todavia, busca a sabedoria e como Sócrates, sabe que nada sabe.

A chácara e a avó
Ontem, 09 08, dia dos pais, fui à chacará em Pirituba.
Nem de longe se parece com aquela chácara daqueles bons tempos de infância.
Tá certo, as coisas mudam, mudam muito mais do que poderia imaginar ou desejar.
Tem os seus pontos positivos e negativos.
Olho ao redor, não vejo mais o verde que alegrava meus finais de semanas, não vejo aqueles babuzais dos tempos de pipas, não vejo nas a jaboticabeira com sua generosidade trasmudada em frutos.
Ah, sim, aquela jaboticabeira que às vezes debaixo dela eu ficava para descansar, ou que por vezes subia para olhar de um lance só toda a chacara.
Já não existe mais.
Somente na alma, em um tempo onde a traça não pode corroer.
Quando cheguei, me deparei com aquela portinha de madeira, que antes era azul e que hoje está pintada de bege.
Lembro me das vezes que chegava, que a minha avó Haydée me esperava, debruçada gritando de lá de cima da casa: "Cado, que saudade de você! " Mas vi que ela não estava lá.
Por um momento, parei para esperar que viesse e me recordei que me esperavas na portinha de madeira, por aquele farto café da manhã, com sabor de família, simplicidade, como se estivesse no interior.
E realmente estava.
O almoço, a tarde conversando, passando a limpo a intimidade em família.
Me lembrei que me esperavas no hospital, na UTI para que rezassemos o pai nosso, a ave maria, para que horas depois, se despedisse do tempo.
E por isso que penso que não basta ser parente, é preciso ser amigo, intimidade que não me mede com palavras, mas com olhares que sabem fazer a leitura de uma alma.
Invoco Mario Quintana: "De que me adianta os livros, se ainda não aprendi a ler as pessoas que estão ao meu lado " A saudade é grande, mas a gratidão também é.
A segurança de ter passado na vida das pessoas e ter vivido com intensidade cada momento com elas, é o segredo que preciso aprender cada vez mais.
As pessoas também.
Não adianta violentar o ser depois que a morte nos ceifa alguém especial e amado.
É sintoma de que não houve um aproveitamento qualitativo.
O amor no qual amamos as pessoas não nos autoriza transformá las em propriedade particular.
Pelo contrário, ensina nos que o amor passa pelo crivo da liberdade, mas que deve ser vivo nos detalhes, intensamente, entretanto, as pessoas que amamos não nos pertencem.
Indo mais longe, nem a nós mesmos nos pertencemos! Tive a experiência de amar minha avó que não mais encontra se no tempo.
Mas está no meu coração e nas recordações mais lindas que me fizeram ser homem e ser pessoa.
O verde pode ser plantado novamente na chácara, mas a ausência dela povoa meu coração, mas não é mais forte do que a certeza de que ela vive no pensamento de Deus!

Embate educacional entre Estado e Família: uma Utopia para a contemporaneidade
Cada vez mais tenho percebido que a educação das pessoas tem desaparecido.
Você que pega ônibus ou metrô todo o dia, sente na pele isso que estou relatando.
Se a disputa para ficar sentado é grande, nem se fala então a disputa por espaços mínimos para poder ficar de pé, ou então para se segurar.
Já vi de tudo: empurrões, pontapés, cotoveladas, grandes guerras por espaços curtíssimos.
Fica latente perceber a subjetividade exarcebada.
A pressa tomou de súbito a gentileza e a subjetividade exarcebada raptou o encontro dos olhares.
Não há espaços nem para quem poderia ter a primazia sobre ele, como idosos, gestantes e pessoas especiais.
Tudo em nome do Eu, tudo em nome de mim, e tudo vai ficando assim.
O que vale é o bem estar privado em detrimento do bem estar coletivo.
Cada qual olhando para o seu próprio umbigo.
Esquecemos a nossa humanidade em um universo muito distante, a bilhões de anos luz daqui.
Lançando um olhar sobre a psicologia contemporânea, constataremos que nenhum ser humano é incoerente, ele é fruto histórico, rede bem encadeada de acontecimentos marcantes.
Age de acordo com sua história tecida em sua existência.
Fico pensando a trama que há entre o processo educativo em que fomos formados e a realidade em que vivemos.
Me questiono sobre as possíveis falhas educacionais da família.
É absurdo atribuir ao estado a função de educar, uma vez que a educação é primazia da família.
Leve se em consideração que a célula mater da sociedade está se decompondo, homens e mulheres que possuem filhos, mas renunciaram a vocação da paternidade e da maternidade.
A subjetividade levada até suas últimas consequências, tão em voga, massacra o indivíduo e a própria família.
Se o estado não dá conta (seja por vias do inviável, seja por desinteresse) de dar cobertura à aquilo que é de sua competência, como por exemplo, transporte público quallitativo e quantitativo, muito menos devemos esperar milagres no plano educacional do ser humano.
Estamos diante de um fenômeno que tomou proporções avassaladoras no nosso tempo.
Não sou homem de respostas rápidas e prontas, quero entender, quero aprender, para me posicionar e agir, sem ilusões.
Mas isso não me impede de pensar que devemos procurar novos areópagos da educação, da gentileza e da gratuidade.
Uma dose de utopia, que em grego, quer dizer um não lugar, um ideal, um lugar que não possua a condição empírica, não faz mal para um mundo puramente instrumental.

Curiosidade e o Mal em Agostinho
Se parar para pensar e analisar a vida na sua totalidade, verá que ela é movida pela curiosidade.
O ser humano em sua consciência e inconsciência busca algo que lhe dê sentido.
Usa e abusa de sua curiosidade e muitas vezes não sabe por que busca e nem sabe o que busca.
Agostinho em seu livro Confissões, trabalha o tema da curiosidade, de como ela pode ser utilizada de maneira errada.
A questão que o filósofo coloca é que há uma “vã curiosidade” que se disfarça de conhecimento e ciência, todavia, não passa de uma paixão de conhecer tudo.
Note que há uma diferença entre conhecer tudo e conhecer o todo.
Não é possível conhecer tudo, em todas as suas peculiaridades.
Contudo, é perfeitamente possível conhecer o todo, possuir uma visão geral do mundo.
A critica agostiniana precisa ser entendida a partir de sua metodologia de conhecer.
É um caminho que parte daquilo que é exterior (realidade) para o interior (coração no sentido de intimidade) e que visa o superior (Deus).
A curiosidade sadia passa pela intimidade, pelo desejo de se conhecer melhor.
Agostinho irá explicar que o mal entrará no mundo por essa “vã curiosidade”.
O mal irá ser encarado como uma privação do ser, pois Deus criou tudo o que é bom e Nele não há mal e nem há a criação do mal por parte Dele.
Esta questão será esclarecida pela graça.
A graça ensina o homem a aprender a vontade de Deus e as suas ações de uma maneira interna, dentro de sua intimidade.
Se por um lado, o pecado original foi herdado pelos homens de uma maneira interna, pela “vã curiosidade”, a graça também agirá de maneira interna pela intimidade.
Cuide de sua curiosidade, procure saber o porquê de sua busca e boa estadia no mundo com as pessoas de seu tempo!