CARTAS
Todas as manhãs, ela verificava as correspondências.
Esperava uma carta, um convite, um postal, não sabia.
Mas sabia de quem receberia.
Do menino da voz, do jeito, do abraço.
Não era real.
Ela o amava tanto que não precisava que a amasse de volta.
Sim, sabia que o garoto tinha defeitos.
Mas não eram importantes.
Todas as vezes, aquela caixinha de correio vazia, só com o mesmo graveto que viu quando iniciou sua jornada.
E a tristeza surgia, aí lembrava que não era real.
Ela não se machucava de verdade, mas aquele sentimento estava ali.
Sabia que encontraria outro alguém, mas guardaria seu primeiro amor não correspondido para sempre.
Talvez, em uma remota possibilidade, o menino a tiraria para dançar, faria uma serenata ou simplesmente dissesse que tudo ficaria bem.
Talvez um pouco antiquada, dessas que escrevem poesia enquanto olham a chuva cair, mas amava.
O amava.
Todos os dias imaginava suas conversas, as músicas que cantariam juntos.
Um amor abstrato como todos os outros.
Mas apesar de tudo, ela escolheu continuar.
Com este amor, com a vida.
Um carimbo em seu coração, de todas as lembranças que para os outros eram nada, para ela a mais profunda prova de amor.
A conversa, o olhar e tudo que acreditava estar subentendido.
Sofreu, amou, sorriu.
E recordando o que nunca seria esquecido, decidiu terminar.
Terminar o amor que nunca fora começado.