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Anna Vargas

Sou a favor da música autêntica, sincera, espontânea.
Daquela que significa algo para você só no momento em que você a escreve, e daquela que transforma algo dentro de você.
Sou a favor daquelas músicas que você escuta pela primeira vez e não curte muito.
Escuta outra vez e não consegue entender o que as pessoas gostam nela.
Continua ouvindo e quando se dá conta já tem ela no seu iPod.
E também sou a favor daquelas que conquistam logo de primeira.
Sou a favor daquelas músicas meio alternativas, que ninguém mais ouve, mas que você (e só você) percebe a genialidade nelas.
Sou a favor de padrões musicais complexos, impopulares, feitos para deliciar ouvidos treinados e confundir ouvidos medíocres.
Mas também sou a favor da simplicidade da música.
Da música minimalista, crua, singela e bucólica.
Que toca você pela essência, pelas emoções, ou só pela batida.
Sou a favor da música que mexe com o corpo.
Da música que dá prazer, que excita, que anima, que te faz perder o controle.
E sou a favor da música que mexe com a alma, que te faz passar da euforia para a melancolia num mero acorde.
Sou a favor das melodias infantis.
Sou a favor da música erudita.
Sou a favor das batidas alucinantes.
Sou a favor da música comercial, porque o que vende é o que as pessoas têm ouvido, e as pessoas ouvem o que toca.
Sou a favor da música que toca.
Sou a favor da boa música, embora boa música signifique uma coisa diferente para cada um.
Sou a favor da música que expressa.
E é por isso que eu entendo atos de quebrar ou até queimar instrumentos musicais no palco, mesmo com dor no coração.
É por isso que entendo as crises de choro, e de riso, e os sussurros, e os gemidos, e os berros de um artista autêntico se apresentando.
A música expressa.
A música mexe.
A música toca.

Ode à imperfeição
Ah! Aqueles cabelos Insistiam em permanecer bagunçados, mesmo nos melhores dias.
Ou aquelas sardas que espalhavam ferrugem sobre a pele tão delicada.
Mas ele tinha aquele jeito solto de andar que dava vontade de se jogar na estrada ao seu lado.
E ela aquele sorriso de dentes brancos e presas salientes.
Quando gargalhava, o quarteirão inteiro ouvia.
Quando se movia, tudo que não estivesse fixo ia ao chão.
Aquele nariz assimétrico combinava lhe tão bem com a assimetria do pensamento.
E a bagunça no seu quarto refletia lhe bem os tormentos da alma.
Mentia às vezes, para ser conveniente.
Exagerava às vezes, só para parecer mais interessante.
Jogava se sem medo, ou apesar do medo.
E não se arrependia, apesar da dor.
Esquecia a cautela em casa, junto com os documentos do carro.
Chorava amargamente.
Até a primeira piada.
Ria em hora errada.
Esquecia datas importantes.
Mas sabia o porquê de ser importante lembrar.
A dieta sofria boicote.
A vida é tão curta para se privar.
O corpo era cheio de curvas.
Contra a luz, novas curvas se revelavam.
Às vezes ela se escondia, envergonhada.
E disfarçava um jeitinho de apagar a luz.
Ele não sabia a hora certa de parar de brincar.
Como se houvesse hora certa para parar de brincar.
Aquele estilo confuso, mas pronunciado, sempre louvava os excessos.
Ele falava demais.
Significava de menos.
Ela falava de menos.
Significava demais.
Tinha mil assuntos inacabados.
As tarefas não chegavam ao fim.
Ele terminava.
Mas não começava muito.
Apegava se demais aos objetos alheios e não suportava deixa los para trás.
Esmigalhava pacientemente a erva ao final do dia.
Seu pequeno ritual de relaxamento.
Tinha mania de completar frases alheias.
Havia tanto a ser conversado ainda.
Saia de casa em horários diversos, só para burlar a rotina.
E bebia e dançava como se amanhã não fosse outro dia.
Sentia pena de todas as estórias de amor que deixava de viver.
Escapava da lei dos homens, vez e outra, só para se sentir dono da lei.
Em meio a tantas coisas imperfeitas, quanta perfeição há!