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Martha Medeiros

Tarde demais
Conheço uma mulher, já quase cinqüentona, que passou boa parte da sua vida apaixonada pelo primeiro namorado.
Eles tiveram um romance caliente lá nos seus 18 anos, depois se separaram e cada um tomou seu rumo.
Ele casou e teve filhos, ela casou e teve filhos.
Nas raras vezes em que se cruzavam pelas ruas da cidade, cumprimentavam se, perguntavam como andava a vida de um e de outro, mas nada além disso.
A verdade é que ela preservou o sentimento que tinha por ele por muitos anos, mesmo sendo feliz no seu casamento.
Era um amor de estimação.
Até que esse amor, tão sem ressonância, tão sem retribuição, tão sem aditivos, um dia evaporou.
Perdeu o prazo de validade.
Expirou.
Dia desses esta mulher recebeu um telefonema.
Era ele.
Oi, tudo bom Há quanto tempo Trivialidades de quem não se fala há anos.
Ela perguntou: o que você conta Ele respondeu que estava ligando para dizer uma única coisa: eu te amo.
Corta.
Não teve happy end.
Ela agradeceu o telefonema, desligaram e ambos seguiram suas vidas.
Conversando com ela sobre isso, senti sua felicidade e desilusão ao mesmo tempo.
Felicidade, logicamente, por ter deixado marcas profundas no coração dele: nem em sonhos ela imaginou que ele também tivesse levado esse sentimento tão adiante.
E a tristeza veio da falta de ressonância, mais uma vez.
Por que a demora Por que a falta de sincronia Como teria sido se ele houvesse dito isso alguns anos antes Agora já não adiantava.
A beleza e a tristeza da vida podem estar em situações como esta: descobrir, tarde demais, que se ama uma pessoa.
Pode acontecer até com quem está ao nosso lado neste instante.
Parece que é um amor morno e sem graça, e que se acabar, tanto faz, e só daqui a muitos anos descobrir que nada era mais forte e raro do que este sentimento.
Tarde demais é uma expressão cruel.
Tarde demais é uma hora morta.
Tarde demais é longe à beça.
Não é lá que devemos deixar florecer nossas descobertas.

VELHOS AMIGOS, NOVOS AMIGOS
Quem é seu melhor amigo(a) Deixe ver se adivinho: estuda na mesma escola ou cursinho, tem a mesma idade (talvez um ano a mais ou a menos), freqüenta o mesmo clube ou a mesma praia.
Se errei, foi por pouco.
Não é vidência: minha melhor amiga também foi minha colega tanto na escola quanto na faculdade e nascemos no mesmo ano.
São amizades extremamente salutares, pois podemos dividir com eles angústias e alegrias próprias do momento que se está vivendo.
Mas fique esperto.
Fechar a porta para pessoas diferentes de você é sinal de inteligência precária.
Durante a adolescência, é vital repartir nossas experiências com pessoas que pensem como nós e que tenham o mesmo pique: é importante sentir se incluído num grupo, de pertencer a uma turma.
Perde se, no entanto, o convívio com pessoas de outras idades e de outros "planetas", que muito poderiam lapidar a nossa visão de mundo.
Entre iguais, tudo é igual.
A vida ganha movimento é na diferença.
Se você é rato de biblioteca, iria se divertir ouvindo as histórias contadas por um alpinista experiente.
Se você tem muita grana, ficaria surpreso em saber como dá duro o cara que trabalha de
dia para poder estudar à noite e o quanto ele precisa economizar para tomar dois chopes no sábado.
Se você curte música, seria bacana conversar com quem curte teatro.
Se você é derrotista, seria uma boa bater um papo com quem já sofreu de verdade.
Você, que se acha uma velha aos 27 anos, iria se divertir muito com os relatos de uma cinquentona irada.
E você, beirando os 60, se surpreenderia com a maturidade de um garoto de 18.
Para os de meia idade, nada melhor do que ter amigos nos dois extremos: da garotada que lhe arrasta para dançar até aqueles que estão numa marcha mais lenta, que já viveram de tudo e de tudo podem falar.
A cabeça da gente comporta rafting e música lírica, videoclipes e dança flamenca, ficar com alguém por uma noite e ficar para sempre.
É importante cultivar afinidades, mas as desafinações ensinam bastante.
No mínimo, nos fazem dar boas risadas.
Vale amizade com executivo e com office boy, com solteiros e casados, meninas e mulheraços, gente que torce para outro time e vota em outro partido.
Vale sempre que houver troca.
Vale inclusive pai e mãe.