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Clarice Lispector

Ao cair de todas as tardes, a Yara, que mora no fundo das águas, surge de dentro delas, magnífica.
Com flores aquáticas enfeita então os cabelos negros e brinca com os peixinhos de escapole escapole.
Mas no mês de maio ela aparece ao pôr do sol para arranjar noivo.
As mães se preocupam com seus filhos varões, sabedoras de que a Yara quer noivos.
Mas para os filhos, Yara é a tentação da aventura, pois há rapazes que gostam de perigo.
À medida que a Yara canta, mais inquietos e atraídos ficam os moços, que, no entanto, não ousam se arriscar.
Sim, mas houve um dia um Tapuia sonhador e arrojado.
Pensativamente estava pescando e esqueceu se de que o dia estava acabando e que as águas já se amansavam.
Foi quando pensou: acho que estou tendo uma ilusão.
Porque a morena Yara, de olhos pretos e faiscantes, erguera se das águas.
O Tapuia teve o medo que todo o mundo tem das sereias arriscadas largou a canoa e correu a abrigar se na taba.
Mas de que adiantava fugir, se o feitiço da Flor das Águas já o enovelara todo Lembrava se do fascínio de seu cantarolar e sofria de saudade.
A mãe do Tapuia adivinhara o que acontecia com o filho: examinava o e via nos seus olhos a marca da fingida sereia.
Enquanto isso, Yara, confiante no seu encanto, esperava que o índio tivesse coragem de casar se com ela.
Pois ainda nesse mês de florido e perfumado maio o índio fugiu da taba e de seu povo, entrou de canoa no rio.
E ficou esperando de coração trêmulo.
Então então a Yara veio vindo devagar, devagar, abriu os lábios úmidos e cantou suave a sua vitória, pois já sabia que arrastaria o Tapuia para o fundo do rio.
Os dois mergulharam e advinha se que houve festa no profundo das águas.
As águas estavam de superfície tranquila como se nada tivesse acontecido.
De tardinha, aparecia a morena das águas a se enfeitar com rosas e jasmins.
Porque um só noivo, ao que parece, não lhe bastava.
Esta história não admite brincadeiras.
Que se cuidem certos homens.