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Gabriel Chalita

ENCONTRO COM A PALAVRA
"Aqui jaz Fernando Sabino.
Nasceu homem, morreu menino".
A frase poética escolhida pelo autor de "O Encontro Marcado" para a sua lápide expõe de maneira sucinta, mas explícita, um pouco da personalidade, dos desejos e anseios de um protagonista da palavra.
Um autor cuja pena produziu, desde a mais tenra juventude, textos fundamentados na sensibilidade capaz de captar a angústia humana como poucos de sua geração souberam fazer.
Sobre ele, um dos maiores críticos literários brasileiros, Antonio Cândido, avalia: "Fernando tinha um olhar infalível para os pormenores expressivos e uma capacidade prodigiosa de invenção verbal".
Com a morte de Sabino, encerra se um tempo singular que, por um desses desígnios inexplicáveis, teve o mérito de reunir, em uma mesma época e em um mesmo cenário a cidade de Belo Horizonte , o famoso quarteto de escritores mineiros composto por Sabino e pelos amigos Hélio Pellegrino, Otto Lara Resende e Paulo Mendes Campos.
Sabino foi o único dos quatro a chegar aos 80 anos.
O único a sentir a ausência corrosiva provocada pela perda das grandes amizades.
Suas dezenas de romances, crônicas, novelas, correspondências e relatos de viagem trazem em sua essência o cerne de um dom raro: o de fazer dessas histórias uma ponte entre a ficção e a reflexão.
Um elo entre o eu e o outro.
Entre o particular e o universal.
A narrativa de Sabino instiga os leitores à realização de uma busca rumo ao autoconhecimento virtude característica dos grandes mestres da palavra.
Foi assim com o personagem Eduardo Marciano que, desde 1956, com a publicação de "O Encontro Marcado", prossegue arrebatando corações e mentes.
A escrita fluente e a leveza que dava a textos de temáticas muitas vezes angustiantes nasciam de um cuidado extremista de Sabino com a palavra.
O mesmo que dedicou à música.
Eclético, como todos que possuem espírito inquieto, Sabino era baterista de uma banda de jazz estilo caracterizado pelo predomínio do improviso sobre a técnica.
Assim também era Sabino na literatura: artista cujo compasso ritmado era marcado pela junção da técnica e da sensibilidade.
A perda do escritor mineiro já seria motivo suficiente para que o reino das palavras ostentasse luto por prazo indefinido.
Entretanto, dois dias antes, o mundo das letras, da filosofia, do pensamento dava adeus ao filósofo Jacques Derrida, famoso pela teoria da "desconstrução", cujo princípio era desfazer o texto do modo que foi previamente organizado para revelar significados ocultos.
Suas pesquisas apontavam que, tanto na literatura como nas demais formas de arte, é possível observar por meio de análises detidas numerosas camadas de significados não necessariamente planejados pelo criador da obra.
Assim como Sabino, Derrida era o único sobrevivente de um grupo ímpar de personagens que ajudaram a compor a história de uma geração.
Juntos, Althusser, Barthes, Deleuze, Foucault, Lacan e Derrida tornaram se conhecidos como "os pensadores de 1968".
Desde então, o filósofo contribuiu sobremaneira para o entendimento de questões essenciais à compreensão do século 20.
O autor de "Espectros de Marx" não se furtava, mesmo já muito doente, o direito de viajar pelos continentes lançando luzes sobre temas variados e polêmicos como a literatura, a política, a ética, os conflitos árabe israelenses, a luta contra o aparthaid, os últimos atentados em solo americano, a rapidez dos processos tecnológicos.
Derrida era um cidadão do mundo, um homem que viveu apaixonadamente e defendeu sua ideologia e seus propósitos de todos os modos.
A justiça, os direitos humanos, a conquista da cidadania e a dignidade da pessoa humana eram, invariavelmente, bandeiras que empunhava em favor da edificação de um tempo mais pacífico e igualitário para povos e nações.
Foi ele, também, o criador, em 1983, do Colégio Internacional de Filosofia, a que presidiu até 1985.
Sem dúvida, as vidas de Sabino e de Derrida são exemplos de entusiasmo e de dedicação.
Convites a uma existência mais pró ativa, passional, conectada à nossa verdade interior e à procura da felicidade individual que se expande para o coletivo.
Foram se dois grandes homens.
Ficam duas grandes lições.
Que todos tenhamos sabedoria para apreender os ensinamentos que deixaram em seus livros e que os manterá, para sempre, vivos.
Afinal, como afirmou Derrida em uma das tantas entrevistas que concedeu: "( ) a vida é sobrevida.
Sobreviver no sentido corrente quer dizer continuar vivendo, mas também viver após a morte".
Publicado no jornal Diário de S.
Paulo

HOMENAGEM AO PROFESSOR: A ORIGEM DOS DIAMANTES
Professores são arautos.
Portadores que se ocupam em levar mensagens diversas aos receptores que, ao fim, simbolizam a esperança que depositamos em novos e melhores tempos.
Movidos por um altruísmo comum aos grandes personagens da História que comumente mesclam em sua jornada um misto de idealismo e capacidade de realização , nosso exército de mestres desbrava fronteiras e adentra aldeias indígenas, comunidades quilombolas, bairros movimentados das metrópoles.
Seja nos cursos mais elementares de alfabetização, seja nas universidades mais renomadas do País, sempre há a figura desse lapidador.
Desses homens e mulheres que, cuidadosamente, permitem que pedras brutas se transformem em jóias cujo brilho é capaz de iluminar o futuro.
Hoje é Dia do Professor.
Data que demanda reflexões sobre o que é realmente essencial no vaivém contínuo do processo ensino aprendizagem.
Momento de observar que, nas últimas décadas, o papel da escola foi ganhando novos contornos.
Novas alterações provenientes de métodos educacionais mais modernos.
Resultantes tanto da troca ininterrupta de experiências no setor quanto da consciência social em torno da importância da educação.
Do ensino de excelência nesta que é a Era da Informação e do Conhecimento.
São mudanças que ampliaram sobremaneira os horizontes.
Renovações que tiveram início com passos importantes rumo à democratização da aquisição de conhecimento.
Hoje, muitas escolas já estão informatizadas e, portanto, conectadas ao mundo.
Exigência de uma época que requer habilidades e talentos cada vez mais diversos, como a fluência em mais de um idioma.
É fato que o mercado de trabalho não tolera amadores.
E também é fato que a cobrança sobre a capacidade dos aprendizes recai sobre o professor.
Profissional de quem a sociedade exige aprimoramento ininterrupto.
Por esse motivo, é importante que os educadores relembrem os modelos referenciais do ensino de qualidade muitas vezes empregado ao longo da História.
É o caso do método utilizado por Aristóteles em seu desejo de formar uma geração de jovens éticos e, portanto, felizes.
O liceu do estagirita era um espaço privilegiado em que a virtude e a busca pelo meio termo permeavam as discussões filosóficas entre o educador e seus jovens aprendizes.
No mesmo diapasão, o filósofo Pedro Abelardo, nas escolas francesas, desafiava os estudantes a colocar em prática o potencial gigante, mas ainda adormecido, que habitava em cada um.
Mais recentemente, temos o modelo de Dom Bosco, mestre dos salesianos.
Verdadeiro professor que exaltava o amor como o único caminho para a educação verdadeiramente completa.
Mário Quintana, em outra seara, poetizava: "E no dia em que tratardes um dragão por Joli, ele te seguirá por toda a parte como se fosse um cachorrinho".
Por meio dessa metáfora tão bela quanto inusitada, o poeta nos ensina que é possível modificar para melhor os seres considerados mais amedrontadores.
Para isso, basta que recebam carinho e atenção como tratamento.
Em outros termos: se até um dragão pode ficar dócil, carinhoso, o que dizer de um aluno
Já Paulo Bonfim, outro artesão da palavra considerado o príncipe dos poetas brasileiros diz que a juventude precisa de um tema.
Um tema que a torne protagonista.
Um tema que a instigue a viver.
É como na arte: uma vez sem bons temas, as peças ficam sem sentido, os textos empobrecem, as danças perdem a magia.
Eis aqui nossa homenagem àqueles que são leais à missão de educar.
Sábios que não servem a um partido ou a um governo, mas sim à causa nobre da educação.
Servem a um sonho.
Talvez o mesmo vivenciado por Aristóteles, Abelardo, Dom Bosco: o sonho de lapidar diamantes.
Mestres que neste, e em todos os outros dias, acreditam que o esforço do trabalho será recompensado pela magnitude do resultado.
Pela beleza rara da jóia que começa a tomar forma, sempre, em suas mãos.
Publicado nos jornais Jornal da Tarde Tarde, Diário do Grande ABC, A Tribuna, Correio Popular e Vale Paraibano.

Respeito e admiração
Professor, professora.
Educadores.
Todo dia é dia do mestre! De quem ensina e de quem aprende.
De quem entende o sublime destino de caminhar ao lado das sendas do conhecimento, do aprendizado, do encontro com o novo, com o recontado.
Histórias do cotidiano de milhares de professores e professoras que nos mais diversos rincões exercitam essa magnífica expressão de amor: partilhar sonhos, medos, angústias, dúvidas, projetos, vida.
Agostinho de Hipona, famoso pregador medieval, ensinava por meio de sermões.
Dizia que o sermão era uma dívida de amor que deveria ser paga sempre.
O amor que transbordava, conhecimento vivo, vivificador.
Palavra poderosa que animava, isso é, dava alma aos fiéis ouvintes.
Rousseau, em Emílio, obra clássica da educação, clamava: "( ) uero ensinar o mais importante: quero ensinar lhe a viver".
É o amor que ensina a viver.
E isso não é utopia.
É o cotidiano dos nossos mestres nas salas de aulas.
Regentes de instrumentos diversos.
Uns mais afinados, outros mais arredios.
Mas todos com sua beleza.
É preciso talento: saber ouvir, puxar a corda até o ponto certo para que não fique frouxa nem arrebente.
Entender o tom e o modo de misturar tantas e tão diversas habilidades.
O resultado é a sinfonia que se nota nas salas de aula, lugar sagrado em que mestres e aprendizes vivem a poesia da vida.
Nietzsche falava dessa poesia nas menores coisas.
O olhar no olhar, por vezes distante e entristecido do aluno.
Por vezes agressivo, não por essência, mas por ausência.
Ausência de afeto, de projetos, de futuro.
Basta dar perspectiva aos jovens e eles se tornam gigantes.
E isso nós também percebemos em nossas escolas.
Dia do mestre.
O governador Geraldo Alckmin conta com entusiasmo sobre seus tempos de professor.
Histórias do curso de madureza.
Histórias da química orgânica, matéria que regia magistralmente como mestre que já antecipava o carinho e o respeito que tem pelas pessoas.
E é esse respeito que faz com que ele coloque a educação como a grande prioridade de seu governo.
E nesse diapasão multiplicam se os projetos e as ações.
A Escola da Família e o desafio de levar 6 milhões de famílias às escolas, nos finais de semana, para a difícil arte da convivência.
Aprendizado conjunto, eficaz.
25 mil bolsas de estudos para jovens carentes egressos de escolas públicas.
É praticamente uma nova universidade.
Além disso, a implantação da USP, na Zona Leste, e a ampliação da UNESP.
O crescimento das Faculdades de Tecnologia.
É o governo educador.
Sério.
Transparente.
Sabe que ainda falta muito, mas tem consciência de que educação é processo e não demagogia.
São Paulo tem os melhores índices de informatização escolar.
Enquanto no Ensino Médio temos 95% das escolas com computadores, a média nacional é de 38%.
É ainda o único Estado que garantiu o curso de graduação aos professores e agora lança o programa Bolsa mestrado para que o mestre que ensina possa aprender cada vez mais.
O investimento em formação continuada não pára por aí: o programa de inclusão digital possibilitou que 60 mil professores pudessem ter computador em casa.
Além disso, criamos programas como Teia do saber e Rede do saber.
A maior rede de videoconferência do País e uma das maiores do mundo com mais de 100 pólos de alta geração, utilizando a tecnologia para desenvolver a sensibilidade.
Dia do mestre.
Tarefa árdua e gratificante.
O que pensa o alfabetizador quando percebe os rabiscos se transformando em letras, palavras, pensamento O que sente o professor de matemática com as primeiras operações que se transformam em equações e demonstram a força do raciocínio E os primeiros estudos de ciências A curiosidade fremente nas descobertas do corpo humano.
Edificadores de uma história em construção perene.
Guerreiros medievais, artistas renascentistas.
A arte.
A magia da arte que leva ao palco, aos muros das escolas, aos corais que multiplicam essa sensibilidade que não pode ficar adormecida.
E a literatura A história dos sentimentos.
História contada por filigranas de quem enxerga um pouco mais e transforma o cotidiano em uma inesquecível narrativa.
E assim sucessivamente.
O conhecimento se avolumando e dando maturidade aos navegadores que ainda temem deixar o porto seguro.
É preciso pensar com liberdade.
Aluno não é receptáculo de conhecimento.
É águia ensaiando vôo.
Respeitar e valorizar o mestre é tarefa de todos.
Governo e sociedade.
Se há professores que não ensinam e que não têm o grande compromisso de educar, essa minoria não pode tirar o brilho da grande plêiade de mestres que dedicam a vida à arte de fazer pessoas felizes.
Arte de amor Como os sermões de Agostinho de Hipona, a educação cotidiana de Rousseau e a poesia da simplicidade de Nietzsche.
Publicado no jornal Diário de S.
Paulo

A invasão da paz
É momento de paz! O mundo clama.
A sociedade anseia.
Paz.
Viver e conviver em harmonia, sem medo, com equilíbrio.
É necessário promover a invasão da paz.
Bem vinda invasão, para reforçar os laços afetivos entre escola e comunidade.
Invasão total: seis mil escolas da rede, em todos os municípios do estado, abrirão as portas, permitindo, incentivando a ocupação do espaço pela comunidade nos fins de semana, no início do próximo semestre letivo.
São esses os objetivos do projeto Escola da Família: Espaços de Paz, parceria entre Secretaria da Educação, Unesco e Instituto Ayrton Senna, que também vai envolver faculdades particulares e seus alunos vindos da rede pública, educadores contratados pelas Associações de Pais e Mestres, além dos milhares de voluntários que já entenderam a missão da partilha e o trabalho de amor.
Daí sairão equipes de planejamento e monitoria de atividades para todos interessados, nas escolas abertas aos sábados e domingos.
Há tempos acontecia encontrar, após o fim de semana, desagradável surpresa na volta à escola.
Arrombamentos, documentos furtados apenas pelo estúpido gosto de fazer o mal, já que nenhum proveito deles se poderia tirar.
Sujeira, pichações nas paredes, equipamentos inutilizados, isso produzia, nos que lidavam com esse quadro, sensação de inutilidade de esforços.
Para eles parecia repetir se o castigo de Sísifo, conforme a tradição da mitologia grega.
Castigo que consistia em empurrar enorme pedra ladeira acima para, em chegando ao alto, ver a pedra rolar ladeira abaixo, descer atrás dela, começar tudo de novo.
Era preciso limpar, arrumar, improvisar, rápido refazer condições para retomada do funcionamento, porque os alunos ali estavam, prontos para suas atividades normais.
Dever cumprido com a consciência da pendente ameaça de ter de fazer tudo outra vez na seguinte segunda feira.
Ameaça que se concretizou muitas vezes.
Fechada nos fins de semana, a escola parecia dar as costas à comunidade.
Alguns de seus menos amigáveis membros forçavam, de modo criminoso e prejudicial a todos, a abertura da escola, promovendo essas invasões indesejadas pela esmagadora maioria.
O argumento fundamental do Escola da Família: Espaços da Paz é a certeza que o isolamento nunca será suficiente para garantir a segurança e a proteção da escola, ao lado de outra certeza: o que atingir a escola estará ferindo a comunidade num dos seus pontos essenciais.
Somente a presença e a ampla participação da família e da comunidade, que é a família ampliada, no interior da escola vão garantir a proteção e a segurança desejadas, para escola e comunidade.
Um espaço de paz e convivência que muito depressa transcenderá aqueles muros.
Quando os envolvidos tiverem a certeza de que a escola é órgão vivo e vital dessa mesma comunidade, estarão prontos a defendê la como se estivessem defendendo suas próprias casas e essa será de fato uma garantia.
É a consciência do pertencimento.
A escola pertence à comunidade.
Isso ficou provado pela sensível queda de índices de violência no entorno das escolas que já desenvolvem atividades durante o fim de semana.
A decisão sobre as atividades oferecidas a esses novos e bem vindos invasores dos sábados e domingos não será tomada à distância, mas no local, pela própria comunidade.
O projeto prevê atividades esportivas e recreativas, culturais, de treinamento e qualificação para o trabalho e de informação para melhoria da qualidade de vida.
A esperança neste projeto é ver dele surgir pessoas interessadas em diversas modalidades esportivas, quem sabe até um atleta de destaque, grupos de teatro, de música, muitos e muitos leitores, poetas expondo e trocando trabalhos, rádios comunitárias fazendo reverberar em ondas cada vez mais amplas as novas possibilidades e idéias que com certeza surgirão nesses alegres fins de semana dentro da escola de portas abertas.
E também gente habilitada a procurar novas possibilidades de colocação na dura luta pela sobrevivência.
Filhos ensinando pais a utilizar o computador.
A magia da convivência, a energia transformadora do afeto capacitando gente a se cuidar melhor, gostar mais de si mesma, viver com mais saúde, saber como melhor aproveitar variadíssimos recursos colocados ao seu alcance.
É o grande desafio da escola.
Ser um centro de luz que irradia para toda a comunidade.
Uma escola atraente, acolhedora.
Cecília Meireles já sonhava, nos idos de 1930, com uma escola que tivesse a poesia das goiabeiras e mangueiras, o canto e a liberdade dos pássaros, o encanto e a cor dos girassóis e margaridas.
Este é um desafio de todos.
Professores, funcionários, pais, alunos, comunidade Todos que têm a consciência dessa divina invasão da paz.
Publicado no Diário de S.
Paulo