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Fabrício Carpinejar

Fico feliz que você não atende aos meus telefonemas.
Fico feliz que você deixa minhas mensagens no vácuo, que você espia, não responde e apaga.
Fico feliz com sua disposição em me destruir e não colar os nossos pedaços.
Fico feliz com sua raiva contida, seus protestos secretos, suas exigências sempre misteriosas, sua atitude intransigente.
Fico feliz com seu extremismo, seu isolamento, seu vestido preto e justo.
Seu luto é lindo.
Fico feliz que você me evita, que você nem fala mais de mim, que cansou de sofrer.
Fico feliz que você pode não me escolher, pode me rejeitar.
Não suporto mesmo mendicância.
Fico feliz que você muda os trajetos para não esbarrar comigo.
Fico feliz que você não escuta nossas músicas, arquivou nosso idioma, jogou fora nossos presentes, fotos e bilhetes.
Fico feliz com a astúcia de sua ausência.
Fico feliz que sou como uma encarnação antiga, que não estou em seu corpo.
Fico feliz que não desperto nem saudade fria, nem saudade quente.
Fico feliz que você não olha minhas páginas no Facebook, no instagram, que desapareceu a curiosidade da dor.
Fico feliz que você já passou de ser vítima do desespero para ser dona do seu desespero e manda e desmanda nas palavras e no silêncio.
Fico feliz que você já voltou a sair, a beber, a contar piadas, a conversar com os amigos.
Fico feliz que você pode me ocultar no jardim de sua memória, sem cruz e sinal de pedras.
Fico feliz que você pode fingir que nada aconteceu, fugir do que aconteceu.
Fico feliz com sua resistência, sua força de vontade.
Fico feliz que está resolvida e não acredita em mim.
Fico feliz com sua estabilidade imediata, sua defesa articulada e coesa.
Fico feliz com seu equilíbrio na tempestade, segurando o desaforo, o guarda chuva e o rosto ao mesmo tempo.
Fico feliz que abandonou as lágrimas, o nariz escorrendo, os ouvidos tremendo.
Fico feliz que recolheu as roupas de sua tristeza.
Fico feliz que se tornou decidida a ponto de me evitar, a ponto de me recusar, a ponto de me esnobar.
Fico feliz que você optou por seguir sua intuição, por concordar com suas premonições, por não se submeter a ser menor do que esperava no amor.
Sem metades, sem mentiras, sem meias promessas.
Fico imensamente feliz que você me nega, que você me esnoba.
Fico tão orgulhoso do que o nosso relacionamento nos ensinou.
Você está pronta para mim.
Necessito de oposição.
Necessito de alguém que me desafie.
Necessito realmente de uma mulher forte ao meu lado.

A vingança encharca a literatura e a música, mas seus mistérios jamais serão esgotados.
Vingança é uma arte, o refinamento da carência.
Quem procura se vingar do ex ou da ex, na verdade, não cansou de brigar.
Não terminou de argumentar.
Vingança é discutir o relacionamento sozinho, é discutir o relacionamento à distância, é dedicar o dia inteiro, às vezes a vida inteira, a arquitetar uma forma de chamar a atenção do amante que negou o ouvido.
O luto é destinado aos que amam amar.
Vinga se a pessoa que odeia amar, odeia continuar amando.
É o encontro do mais extremo ódio com o mais extremo amor.
A união de dois terrorismos.
Vinga se aquele que acredita que deu mais do que recebeu e que se enxerga ludibriado.
Aquele que, durante a relação, cobrava em segredo tudo o que oferecia, listava presentes e gestos.
A vingança é o juízo final do avarento amoroso.
Indica também prepotência.
O vingador se enxerga superior ao vingado, mais experiente e sábio.
Acha que está ensinando seu antigo par.
Encarna a figura de professor repreendendo o erro do aluno.
Assim como não sofre em vão, somente se humilha para humilhar o outro.
Todo sofrimento é arrogante, debitado na conta do desafeto.
O vingador cobiça a última palavra pois não aceita que alguém pense o pior dele.
Planeja castigar as supostas distorções e intimidar as possíveis confissões de sua intimidade.
O vingador vive por hipóteses.
Não entendeu que a última palavra não existe, é uma desculpa para mandar.
A vingança é o mais paradoxal dos atos: um sentimento inteligente em mãos burras e desgovernadas; uma pressa que exige longa paciência e dissimulação.
Requer as mais contraditórias atitudes: sangue frio de alguém com sangue quente; calar se apesar da exagerada vontade de falar.
A vingança fracassa pela ânsia de fama do seu autor.
Quem busca se vingar pretende que o outro saiba que foi ele, que não tenha nenhuma dúvida.
Deseja dar o troco beijando a boca, olhando nos olhos.
Conclui que não adianta nada uma vingança sem remetente.
E peca pela ambição, erra ao se expor, porque a represália aguda e exitosa esconde o criminoso para a perfeição do crime; deve ser anônima, gerando a desconfiança, mas não entregando totalmente o seu mentor.
Não conheço vingança perfeita.
Não se vingar talvez seja a melhor vingança.
Fazer esperar uma resposta que nunca virá.