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Artur da Távola

AMOR QUE NÃO COBRA
O amor maduro não é menor em intensidade.
Ele é apenas quase silencioso.
Não é menor em extensão.
É mais definido, colorido e poetizado.
Não carece de demonstrações: presenteia com a verdade do sentimento.
Não precisa de presenças exigidas: amplia se com as ausências significantes.
O amor maduro somente aceita viver os problemas da felicidade.
Problemas da felicidade são formas trabalhosas de construir o bem e o prazer.
Problemas da infelicidade não interessam ao amor maduro.
O amor maduro cresce na verdade e se esconde a cada auto ilusão.
Basta se com o todo do pouco.
Não precisa nem quer nada do muito.
Está relacionado com a vida e a sua incompletude, por isso é pleno em cada ninharia por ele transformada em paraíso.
É feito de compreensão, música e mistério.
É a forma sublime de ser adulto e a forma adulta de ser sublime e criança.
O amor maduro não disputa, não cobra, pouco pergunta, menos quer saber.
Teme, sim.
Porém, não faz do temor, argumento.
Basta se com a própria existência.
Alimenta se do instante presente valorizado e importante porque redentor de todos os equívocos do passado.
O amor maduro é a regeneração de cada erro.
Ele é filho da capacidade de crer e continuar, é o sentimento que se manteve mais forte depois de todas as ameaças, guerras ou inundações existenciais com epidemias de ciúme.
O amor maduro é a valorização do melhor do outro e a relação com a parte salva de cada pessoa.
Ele vive do que não morreu mesmo tendo ficado para depois.
Vive do que fermentou criando dimensões novas para sentimentos antigos, jardins abandonados cheios de sementes.
Ele não pede, tem.
Não reivindica, consegue.
Não persegue, recebe.
Não exige, dá.
Não pergunta, adivinha.
Existe, para fazer feliz.
Só teme o que cansa, machuca ou desgasta.

Talvez seja tão simples, tolo e natural que você nunca tenha parado para pensar: aprenda a fazer bonito o seu amor.
Ou fazer o seu amor ser ou ficar bonito.
Aprenda, apenas, a tão difícil arte de amar bonito.
Gostar é tão fácil que ninguém aceita aprender.
Tenho visto muito amor por aí, amores mesmo, bravios, gigantescos, descomunais, profundos, sinceros, cheios de entrega, doação e dádiva, mas esbarram na dificuldade de se tornar bonito.
Apenas isso: bonitos, belos ou embelezados, tratados com carinho, cuidado e atenção.
Amores levados com arte e ternura de mãos jardineiras.
Aí esses amores que são verdadeiros, eternos e descomunais de repente se percebeu ameaçados apenas e tão somente porque não sabem ser bonitos: cobram; exigem; rotinizam; descuidam; reclamam; deixam de compreender; necessitam mais do que oferecem; precisam mais do que atendem; enchem se de razões.
Sim, de razões.
Ter razão é o maior perigo no amor.
Quem tem razão sempre se sente no direito (e o tem) de reivindicar, de exigir justiça, equidade, equiparação, sem atinar que o que está sem razão talvez passe por um momento de sua vida no qual não possa ter razão.
Nem queira.
Ter razão é um perigo: em geral enfeia o amor, pois é invocado com justiça mas na hora errada.
Amar bonito é saber a hora de ter razão.
Ponha a mão na consciência.
Você tem certeza que está fazendo o seu amor bonito
De que está tirando do gesto, da ação, da reação, do olhar, da saudade, da alegria do encontro, da dor do desencontro, a maior beleza possível Talvez não.
Cheio ou cheia de razões, você espera do amor apenas aquilo que é exigido por suas partes necessitadas, quando talvez dele devesse pouco esperar, para valorizar melhor tudo de bom que de vez em quando ele pode trazer.
Quem espera mais do que isso sofre, e sofrendo deixa de amar bonito.
Sofrendo, deixa de ser alegre, igual criança.
E sem soltar a criança, nenhum amor é bonito.
Não tema o romantismo.
Derrube as cercas da opinião alheia.
Faça coroas de margaridas e enfeite a cabeça de quem você ama.
Saia cantando e olhe alegre.
Recomendam se: encabulamentos; ser pego em flagrante gostando; não se cansar de olhar, e olhar; não atrapalhar a convivência com teorizações; adiar sempre, se possível com beijos, “aquela conversa importante que precisamos ter”, arquivar se possível, as reclamações pela pouca atenção recebida.
Para quem ama toda atenção é sempre pouca.
Quem ama feio não sabe que pouca atenção pode ser toda atenção possível.
Quem ama bonito não gasta o tempo dessa atenção cobrando a que deixou de ter.
Não teorize sobre o amor (deixe isso para nós, pobres escritores que vemos a vida como criança de nariz encostado na vitrine, cheia de brinquedos dos nossos sonhos): não teorize sobre o amor, ame.
Siga o destino dos sentimentos aqui e agora.
Não tenha medo exatamente de tudo o que você teme, como: a sinceridade; não dar certo; depois vir a sofrer (sofrerá de qualquer jeito); abrir o coração; contar a verdade do tamanho do amor que sente.
Jogue pro alto todas as jogadas, estratagemas, golpes, espertezas, atitudes sabidamente eficazes (não é sábio ser sabido): seja apenas você no auge de sua emoção e carência, exatamente aquele você que a vida impede de ser.
Seja você cantando desafinado, mas todas as manhãs.
Falando besteiras, mas criando sempre.
Gaguejando flores.
Sentindo o coração bater como no tempo
do Natal infantil.
Revivendo os carinhos que instruiu em criança.
Sem medo de dizer, eu quero, eu gosto, eu estou com vontade.
Talvez aí você consiga fazer o seu amor bonito, ou fazer bonito o seu amor, ou bonitar fazendo seu amor, ou amar fazendo o seu amor bonito (a ordem das frases não altera o produto), sempre que ele seja a mais verdadeira expressão de tudo o que você é e nunca, deixaram, conseguiu, soube, pôde, foi possível, ser.
Se o amor existe, seu conteúdo já é manifesto.
Não se preocupe mais com ele e suas definições.
Cuide agora da forma.
Cuide da voz.
Cuide da fala.
Cuide do cuidado.
Cuide do carinho.
Cuide de você.
Ame se o suficiente para ser capaz de gostar do amor e só assim poder começar a tentar fazer o outro feliz.