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Martha Medeiros

Super gaúcha
Sou urbana, gosto de cidade grande, não gosto de mato, de bicho e de pão feito em casa.
Pronto.
Falei.
Acredite: não é um desvio de caráter.
É o meu jeito.
Minhas preferências.
Não jogue no lixo tudo o que a gente construiu juntos só por causa deste detalhezinho bobo.
Desde que eu era pequena que sítios, fazendas e assemelhados nunca me seduziram.
Tenho medo de cobra, não sei andar a cavalo e suo frio só em pensar em encontrar uma perereca no banheiro.
Eu bem que gostaria de me adaptar, pois se todo mundo diz que não há nada melhor do que a vida no campo, alguma verdade há nisso.
Eu gosto de árvores, de flores, de silêncio, eu fiz minhas tentativas.
Eu tentei ser normal.
Achei que bastaria calçar botas de couro, mas é pouco.
É preciso vocação.
Minha inaptidão para o mundo campeiro fica bem demonstrada quando o assunto é gastronomia.
Eu não gosto de charque.
Eu não gosto de chimarrão.
Eu não gosto de doce de abóbora.
Eu não gosto de leite recém tirado da vaca.
Restou me a resignação: vim ao mundo com este defeito de fábrica e não há nada que se possa fazer.
Todas as pessoas possuem uma espécie de deficiência, e algumas são bem piores do que as minhas.
Há quem seja vegetariano.
Não cheguei a esse extremo.
Uma picanha, não recuso.
Mal passada, melhor ainda.
Estamos vivendo uma fase de ufanismo gaudério.
De repente, o Rio Grande do Sul ganhou destaque, devido à minissérie e ao livro A Casa das Sete Mulheres, da minha talentosa amiga Leticia Wierzchovski.
Toda a população está se sentindo orgulhosa de pertencer a esta terra.
Uma rede de lojas, recentemente, colocou uma campanha publicitária no ar com a seguinte pergunta: o que é ser gaúcho As melhores respostas ganharam prêmios.
Eu não ganharia nem um tapinha nas costas.
Ser gaúcha, eu responderia, é gostar de ler Michael Cunningham, de ir ao cinema, de viajar para o Rio, para Punta, para Nova York.
É caminhar na esteira de uma academia, trabalhar até tarde num escritório e antes de voltar pra casa passar no Zaffari e comprar uma pizza congelada.
Ser gaúcha é ouvir bossa nova, gostar de praia e ficar só de camiseta e meias comendo Ruffles na frente da tevê.
É preocupar se com a meteorologia porque amanhã é dia de fazer escova e você morre de medo que chova e o cabelo vá por água abaixo.
É acordar com as galinhas, mas sem ver as galinhas, a não ser na hora do almoço, grelhadas.
Ser gaúcha é ter bom humor e nojo de barata, é adorar a Internet e assistir ao pôr do sol da sacada.
Ser gaúcha é ter nascido aqui mas ser feliz em qualquer lugar, com o estilo de vida que escolher.
Eu me sinto tão gaúcha quanto as prendas que dançam nos CTGs, tão gaúcha quanto as mulheres que encilham cavalos, que cozinham em fogões a lenha, que ordenham vacas e bordam tapetes.
Aliás, eu bordo tapetes.
Aliás, eu nasci neste Estado.
Aliás, somos todos gaúchos, nenhum mais gaúcho que o outro.

VELHOS AMIGOS, NOVOS AMIGOS
Quem é seu melhor amigo(a) Deixe ver se adivinho: estuda na mesma escola ou cursinho, tem a mesma idade (talvez um ano a mais ou a menos), freqüenta o mesmo clube ou a mesma praia.
Se errei, foi por pouco.
Não é vidência: minha melhor amiga também foi minha colega tanto na escola quanto na faculdade e nascemos no mesmo ano.
São amizades extremamente salutares, pois podemos dividir com eles angústias e alegrias próprias do momento que se está vivendo.
Mas fique esperto.
Fechar a porta para pessoas diferentes de você é sinal de inteligência precária.
Durante a adolescência, é vital repartir nossas experiências com pessoas que pensem como nós e que tenham o mesmo pique: é importante sentir se incluído num grupo, de pertencer a uma turma.
Perde se, no entanto, o convívio com pessoas de outras idades e de outros "planetas", que muito poderiam lapidar a nossa visão de mundo.
Entre iguais, tudo é igual.
A vida ganha movimento é na diferença.
Se você é rato de biblioteca, iria se divertir ouvindo as histórias contadas por um alpinista experiente.
Se você tem muita grana, ficaria surpreso em saber como dá duro o cara que trabalha de
dia para poder estudar à noite e o quanto ele precisa economizar para tomar dois chopes no sábado.
Se você curte música, seria bacana conversar com quem curte teatro.
Se você é derrotista, seria uma boa bater um papo com quem já sofreu de verdade.
Você, que se acha uma velha aos 27 anos, iria se divertir muito com os relatos de uma cinquentona irada.
E você, beirando os 60, se surpreenderia com a maturidade de um garoto de 18.
Para os de meia idade, nada melhor do que ter amigos nos dois extremos: da garotada que lhe arrasta para dançar até aqueles que estão numa marcha mais lenta, que já viveram de tudo e de tudo podem falar.
A cabeça da gente comporta rafting e música lírica, videoclipes e dança flamenca, ficar com alguém por uma noite e ficar para sempre.
É importante cultivar afinidades, mas as desafinações ensinam bastante.
No mínimo, nos fazem dar boas risadas.
Vale amizade com executivo e com office boy, com solteiros e casados, meninas e mulheraços, gente que torce para outro time e vota em outro partido.
Vale sempre que houver troca.
Vale inclusive pai e mãe.