Porque eu tenho pesadelos que parecem tão reais até quando você me abraça.
E eu acordo triste, e brigo de verdade e passo o dia grave e dolorida como quando a gente leva um tombo no piso liso que é só o passado.
É como se eu sentisse um ciúme horroroso do meu livro predileto comprado em sebo, a dedicatória apaixonada que não é a minha, os resquícios do manuseio de outras mãos.
Alguém corrompeu o trecho que eu mais gostava quando grifou à caneta algo que não pude apagar com borracha e que era tão secretamente meu.
Desenhou corações onde só havia minha dor e eu discordei da interpretação alheia.
E achei aquilo tudo de uma crueldade atroz.
Mas permaneci com o livro no colo, cheia de um afeto confuso por ele: afeto pelo que era, angústia por já ter sido de outro alguém, e aquela sensação (imbecil) de falta de exclusividade.
Eu que sempre achei que tudo é e está para o mundo.
Perdoa o meu senso de autoimportância, já que não consigo perdoar o meu egoísmo.
Eu sei que em alguns presentes, no embrulho, laços do passado são aproveitados.
Eu só queria que eles não fossem tão vermelhos: desses que doem nos olhos e no coração.