Para onde vai a minha vida, e quem a leva
Por que faço eu sempre o que não queria
Que destino contínuo se passa em mim na treva
Que parte de mim, que eu desconheço, é que me guia
O meu destino tem um sentido e tem um jeito,
A minha vida segue uma rota e uma escala
Mas o consciente de mim é o esboço imperfeito
Daquilo que faço e sou: não me iguala
Não me compreendo nem no que, compreeendendo, faço.
Não atinjo o fim ao que faço pensando num fim.
É diferente do que é o prazer ou a dor que abraço.
Passo, mas comigo não passa um eu que há em mim.
Quem sou, senhor, na tua treva e no teu fumo
Além da minha alma, que outra alma há na minha
Por que me destes o sentimento de um rumo,
Se o rumo que busco não busco, se em mim nada caminha
Senão com um uso não meu dos meus passos, senão
Com um destino escondido de mim nos meus atos
Para que sou consciente se a consciência é uma ilusão
Que sou entre quê e os fatos
Fechai me os olhos, toldai me a vista da alma!
Ó ilusões! Se eu nada sei de mim e da vida,
Ao menos eu goze esse nada, sem fé, mas com calma,
Ao menos durma viver, como uma praia esquecida "
Fernando Pessoa