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Martha Medeiros

Caça
Por que é importante ler Pergunta recorrente em qualquer encontro de escritores com estudantes.
E a gente acaba desfiando um rosário de respostas prontas, um blá blá blá repetitivo, apesar de necessário.
Mas hoje vou dar um exemplo prático.
Estava lendo uma revista nem era um livro quando me deparei com uma entrevista feita com o chef Philippe Legendre, estrela da gastronomia francesa de quem nunca provei um ovo frito.
Ignorante sobre quem era o cara, li.
Lá pelas tantas, o repórter: "É verdade que o senhor adora caçar " O chef: "Eu caço o silêncio.
Atiro no barulho."
Bum!
Perdizes, faisões, coelhos, sei lá o quê o tal homem caça todo final de semana e nem me interessa.
O importante foi o impacto causado por aquelas duas frasezinhas curtas que pareciam um poema e que empurraram meu pensamento para além daquelas páginas, me puseram a pensar sobre minhas próprias perseguições.
Caço o silêncio.
Atiro no barulho.
Eu idem, monsieur.
Eu caço o sossego.
Atiro na tevê.
Eu caço afeto.
Atiro em gente rude.
Eu caço liberdade.
Atiro na patrulha.
Eu caço amigos.
Atiro em fantasmas.
Eu caço o amanhã.
Atiro no ontem.
Eu caço prazeres.
Atiro no tédio.
Eu caço o sono.
Atiro no sol.
E quando caço o sol, atiro em relógios.
Acho que é isto que a leitura faz.
Nos solta na floresta com uma arma na mão.
Nos dá munição para atirar em tudo o que nos distrai de nós mesmos, no que nos desconcentra.
O livro não permite que fiquemos sem nos escutar.
A leitura faz eu mirar em mim e acertar no que eu nem sabia que também sentia e pensava.
E, por outro lado, me ajuda a matar tudo o que pode haver em mim de limitante: preconceitos, idéias fixas, hipocrisias, solenidades, dores cultuadas.
Lendo, eu caço a mim e atiro em mim.

VELHOS AMIGOS, NOVOS AMIGOS
Quem é seu melhor amigo(a) Deixe ver se adivinho: estuda na mesma escola ou cursinho, tem a mesma idade (talvez um ano a mais ou a menos), freqüenta o mesmo clube ou a mesma praia.
Se errei, foi por pouco.
Não é vidência: minha melhor amiga também foi minha colega tanto na escola quanto na faculdade e nascemos no mesmo ano.
São amizades extremamente salutares, pois podemos dividir com eles angústias e alegrias próprias do momento que se está vivendo.
Mas fique esperto.
Fechar a porta para pessoas diferentes de você é sinal de inteligência precária.
Durante a adolescência, é vital repartir nossas experiências com pessoas que pensem como nós e que tenham o mesmo pique: é importante sentir se incluído num grupo, de pertencer a uma turma.
Perde se, no entanto, o convívio com pessoas de outras idades e de outros "planetas", que muito poderiam lapidar a nossa visão de mundo.
Entre iguais, tudo é igual.
A vida ganha movimento é na diferença.
Se você é rato de biblioteca, iria se divertir ouvindo as histórias contadas por um alpinista experiente.
Se você tem muita grana, ficaria surpreso em saber como dá duro o cara que trabalha de
dia para poder estudar à noite e o quanto ele precisa economizar para tomar dois chopes no sábado.
Se você curte música, seria bacana conversar com quem curte teatro.
Se você é derrotista, seria uma boa bater um papo com quem já sofreu de verdade.
Você, que se acha uma velha aos 27 anos, iria se divertir muito com os relatos de uma cinquentona irada.
E você, beirando os 60, se surpreenderia com a maturidade de um garoto de 18.
Para os de meia idade, nada melhor do que ter amigos nos dois extremos: da garotada que lhe arrasta para dançar até aqueles que estão numa marcha mais lenta, que já viveram de tudo e de tudo podem falar.
A cabeça da gente comporta rafting e música lírica, videoclipes e dança flamenca, ficar com alguém por uma noite e ficar para sempre.
É importante cultivar afinidades, mas as desafinações ensinam bastante.
No mínimo, nos fazem dar boas risadas.
Vale amizade com executivo e com office boy, com solteiros e casados, meninas e mulheraços, gente que torce para outro time e vota em outro partido.
Vale sempre que houver troca.
Vale inclusive pai e mãe.