AMOR E TEMPO
Tudo cura o tempo, tudo faz esquecer, tudo gasta, tudo digere, tudo acaba.
Atreve se o tempo a colunas de mármore, quanto mais a corações de cera!
São as afeições como as vidas, que não há mais certo sinal de haverem de durar pouco, que terem durado muito.
São como as linhas, que partem do centro para a circunferência, que quanto mais continuadas, tanto menos unidas.
Por isso os antigos sabiamente pintaram o amor menino; porque não há amor tão robusto que chegue a ser velho.
De todos os instrumentos com que o armou a natureza, o desarma o tempo.
Afrouxa lhe o arco, com que já não atira; embota lhe as setas, com que já não fere; abre lhe os olhos, com que vê o que não via; e faz lhe crescer as asas, com que voa e foge.
A razão natural de toda esta diferença é porque o tempo tira a novidade às coisas, descobre lhe os defeitos, enfastia lhe o gosto, e basta que sejam usadas para não serem as mesmas.
Gasta se o ferro com o uso, quanto mais o amor ! O mesmo amar é causa de não amar e o ter amado muito, de amar menos.