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Certeza

"Acordo todas as manhãs com este zumbido e a certeza que não vais voltar.
Cansada de me convencer que, apesar e acima do teu individualismo estava a tal inevitabilidade a que nos submetemos e chamamos amor.
Pensei que, com todo o amor que sentia por ti te iria suavizar o coração e de alguma forma fazer parte do teu equilíbrio, tornando me subtilmente indispensável.
Hélas.
Nunca pensei enganar me tanto.
Mas só agora percebo que o teu amor por mim não foi uma inevitabilidade, mas uma escolha.
Alguém que te chamou a atenção e que um dia decidiste que querias atravessar, com a intuição certeira de um animal selvagem que procura refugio temporário, quando está cansado.
Sei que não vinhas a fugir de nada, nem à procura de coisa nenhuma.
Mas acho que quando eras pequeno te arrancaram uma parte de ti, e desde então ficaste incompleto e perdeste, quem sabe talvez para sempre, a capacidade de adormecer nos braços de alguém sem que penses no perigo de ficar na armadilha do carinho para todo o sempre.
Não, o teu amor por mim, volto a dizê lo, não foi uma inevitabilidade, mas uma escolha feita com a leveza e a frontalidade com que fazes tudo na vida.
Por isso te foi tão linear e repara que não escrevo a palavra fácil escolher outro caminho.
Mas não foi assim para mim.
Entraste a 200 à hora na minha vida, e quando te vi pela primeira vez a passar a porta da minha casa onde viveste quase um ano quase todos os dias, deixei me levar por essa inevitabilidade, submetendo me a tudo o que depois se seguiu, e chamando lhe amor.
Um amor total, gratuito, despojado, com o corpo, a cabeça e o coração todos enterrados lá dentro."

Assim que a gente entrega a alma, tudo continua com mortal certeza, mesmo no meio do caos.
Desde o princípio, jamais passou de outra coisa que não o caos: um fluido que me envolvia, que eu respirava pelas guelras.
Nos substratos, onde a lua brilhava constante e opaca, era liso e fecundante; acima, confusa vozearia e discórdia.
Em tudo eu via logo um oposto, uma contradição, e entre o real e irreal, a ironia, o paradoxo.
Eu era o meu pior inimigo.
Não desejava fazer nada que fosse melhor não fazer.
Mesmo em criança, quando não me faltava nada, queria morrer: queria render me porque não via sentido em lutar.
Sentia que nada se provaria, consubstanciaria, somaria ou subtrairia pela continuação de uma existência que eu não pedira.
Todos á minha volta eram um fracasso, ou, se não, ridículos.
Sobretudo os bem sucedidos.
Estes me entediavam até as lágrimas.
Eu era excessivamente compreensivo, mas não por simpatia.
Era uma qualidade totalmente negativa, uma fraqueza que desabrochava à simples visão da infelicidade humana.
Jamais ajudei a quem quer que fosse esperando que isso fizesse algum bem; ajudava porque não podia agir de outro modo.
Parecia me fútil querer mudar a condição das coisas; convencera me de que nada se alteraria, a não ser uma mudança de opinião, e quem conseguiria mudar opiniões dos homens De vez em quando, um amigo se convertia: coisa que me dava engulhos.
Eu não precisava mais de Deus do que Ele de mim, e se houvesse um Deus, dizia me muitas vezes, eu O enfrentaria com toda calma e cuspiria em Sua cara.